Oferta de serviços e recursos humanos da Rede de Atenção Psicossocial no Brasil

Offer of services and human resources of the Psychosocial Care Network in Brazil

Oferta de servicios y recursos humanos de la Red de Atención Psicosocial en Brasil

Murielly Priscilly de Medeiros Maia

Ana Kalliny de Sousa Severo

Wilton Rodrigues Medeiros

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

Yan Nogueira Leite de Freitas

Universidade Federal do Amazonas (UFAM)

Héllyda de Souza Bezerra1

Roberta Machado Alves

Isabelle Ribeiro Barbosa

Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)

Resumo

Objetivo: analisar a distribuição espacial da estrutura e dos recursos humanos que compõem a Rede de Atenção Psicossocial, de acordo com as Regiões Imediatas de Articulação Urbana (RIAU) no Brasil. Métodos: o estudo analisou 27 variáveis de estrutura e nove variáveis de recursos humanos registradas no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde. Foi realizada análise descritiva e análise espacial pelas técnicas de Moran Global (I) e Local. Resultados: foi caracterizada a inexistência dos serviços para mais de 75% das RIAU. Para as variáveis “ACS, UBS, NASF I e Médicos da Família”, clusters de altas taxas estão localizados no Nordeste. Já para as variáveis “Psicólogos, Psiquiatras e Terapeuta Ocupacional”, os aglomerados de elevadas taxas se concentram nas regiões Sudeste e parte do Sul. Conclusão: existem vazios assistenciais na Rede de Atenção Psicossocial na região Norte do Brasil, com maior concentração de serviços e de profissionais nas regiões Sul e Sudeste.

Palavras-chave: indicadores de serviços, avaliação de serviços de saúde, serviços de saúde mental, análise espacial

Abstract

Objective: To analyze the spatial distribution of the structure and human resources that make up the Psychosocial Care Network, according to the Immediate Regions of Urban Articulation (RIAU) in Brazil. Methods: The study analyzed 27 structure variables and nine human resources variables registered in the National Register of Health Facilities. Descriptive analysis and spatial analysis were performed using Moran Global (I) and Local techniques. Results: The lack of services was characterized for more than 75% of the RIAU. For the variables “ACS, UBS, NASF I and Family Physicians”, high-rate clusters are located in the Northeast. Regarding the variables “Psychologists, Psychiatrists and Occupational Therapist”, the high-rate clusters are concentrated in the Southeast and Southern parts. Conclusion: there are care gaps in the Psychosocial Care Network in Northern Brazil, with a higher concentration of services and professionals in the South and Southeast.

Keywords: indicators of health services, health services research, mental health services, spatial analysis

Resumen

Objetivo: Analizar la distribución espacial de la estructura y los recursos humanos que conforman Red de Atención Psicosocial, según las Regiones Inmediatas de Articulación Urbana (RIAU) en Brasil. Métodos: El estudio analizó 27 variables de estructura y nueve variables de recursos humanos registradas en el Registro Nacional de Instalaciones de Salud. El análisis descriptivo y el análisis espacial se realizaron utilizando las técnicas Moran Global (I) y Local. Resultados: La falta de servicios se caracterizó en más del 75% de RIAU. Para las variables “ACS, UBS, NASF I y Médicos de Familia”, los grupos de alta tasa se encuentran en el noreste. Para las variables “Psicólogos, Psiquiatras y Terapeuta Ocupacional”, los grupos de alta tasa se concentran en el Sudeste y el Sur. Conclusión: existen brechas asistenciales en la Red de Atención Psicosocial en el Norte de Brasil, con una mayor concentración de servicios y profesionales en el Sur y Sudeste.

Palabras clave: indicadores de servicios, investigación sobre servicios de salud, servicios de salud mental, análisis espacial

Introdução

O modelo de atenção em saúde mental no Brasil vem passando por transformações gradativas desde a Reforma Psiquiátrica. A aprovação da Lei n. 10.216/2001, que apoia a Política Nacional de Saúde Mental no SUS, propôs a substituição do método manicomial/asilar, medicalocêntrico e punitivo pelo processo de ação/intervenção da Atenção Psicossocial, em prol da ressocialização dos indivíduos em sofrimento psíquico através do cuidado contínuo no território (Brasil, 2001). Dez anos após a aprovação dessa lei, a Atenção Psicossocial foi formalizada como rede assistencial através da Portaria Ministerial n. 3.088/2011 (Brasil, 2011), a qual reorganizou o cuidado em saúde mental, a partir da proposição da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) no país (Ferrazza & Rocha, 2015).

A RAPS, uma das redes temáticas inclusas nas Redes de Atenção à Saúde (RAS), está territorialmente organizada segundo os critérios de regionalização em saúde e se baseia nos conceitos de hierarquização e integralidade da assistência. Deste modo, atualmente, a RAPS é composta por serviços de atenção primária; atenção psicossocial especializada; atenção às urgências e emergências; atenção hospitalar; atenção residencial de caráter transitório; estratégia de desinstitucionalização e reabilitação psicossocial; Equipe Multiprofissional de Atenção Especializada em Saúde Mental; Unidades Ambulatoriais Especializadas; Unidade de Referência Especializada em Hospital Geral; Hospital Psiquiátrico Especializado e Hospital Dia, todos destinados ao atendimento/acolhimento daqueles em sofrimento mental e/ou necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas (Macedo, Abreu, Fontenele, & Dimenstein, 2017; Cunha, Massih, & Raccioni, 2017; Brasil, 2017; Santos, Pessoa Junior, & Miranda, 2018).

Nestes serviços, prioriza-se o trabalho em equipe, composta por um time multiprofissional, que desenvolve ações e atividades de acolhimento/acompanhamento dos usuários, de maneira individual e em grupos, bem como assistência às famílias (Santos, Pessoa Junior, & Miranda 2018). A RAPS tornou-se uma estratégia para o acesso universal e de qualidade a todos os serviços que a compõem, a fim de garantir um cuidado integral, humanizado e centrado nas demandas dos usuários, considerando os determinantes sociais da saúde. Essas mudanças estruturais reverberaram nas práticas laborais na área da psiquiatria, apontando para a necessidade de adequação de seus trabalhadores aos dispositivos extra-hospitalares (Bernadi & Kanan, 2015; Nóbrega, Domingos, Silveira, & Santos, 2017; Brasil, 2019). Além disso, as novas propostas do Ministério da Saúde para a RAPS, no âmbito da saúde mental, propõem que a assistência no SUS siga com as mais adequadas práticas clínicas e que as equipes multiprofissionais sigam as mais recentes evidências científicas, em busca de uma melhora na qualidade da assistência (BRASIL, 2019).

As pautas sobre descentralização e regionalização em saúde mental ganharam força nos últimos anos, com o objetivo de consolidar a participação municipal na construção de redes integradas de serviços, as quais priorizem ações territoriais e de base comunitária. Neste sentido, a regionalização da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) aponta para avanços quanto à instituição de uma rede integrada de serviços da atenção psicossocial em cada território de saúde, com aumento em número e diversidade de pontos de apoio e tendência à interiorização da assistência para municípios de médio e pequeno porte (Macedo et al., 2017). Nesse contexto, alguns indicadores são uma importante ferramenta para auxílio à gestão em saúde quanto à avaliação das políticas públicas das regiões e redes assistenciais, a partir de seus desempenhos em cobertura e efetividade dos recursos a elas pertinentes e, de fato, disponíveis. No âmbito regional, ajudam a medir e avaliar o funcionamento do sistema de saúde, considerando sua divisão territorial e de governança (Paschoalotto et al., 2018; Miclos, Calvo, & Colussi, 2015).

Uma perspectiva para a avaliação das Redes de Atenção à Saúde (RAS) é a análise da disponibilidade dos recursos humanos e estruturas disponíveis. Essa análise considera todos os seus níveis de assistência e sua distribuição territorial em Regiões de Saúde, tornando-se uma estratégia para identificar as fragilidades que dificultam a sistematização operacional dos serviços de saúde, em prol da resolutividade desejada (Miclos, Calvo, & Colussi, 2015). Por meio dos resultados da avaliação em saúde mental, pode-se refletir, elencar e discutir os principais desafios para implantação e implementação dos serviços e ações de saúde necessários às demandas dessa área. Sendo assim, a produção de conhecimento neste campo não somente auxilia no diagnóstico situacional da rede assistencial RAPS, mas também traz novas perspectivas no emprego dos resultados obtidos, como o confronto de indicadores estruturais com desfechos epidemiológicos em saúde mental (Costa, Colugnati, & Rozani, 2015).

As Regiões Imediatas de Articulação Urbana (RIAU) são espaços cujo critério de agrupamento é bem semelhante ao das Regiões de Saúde, considerando não somente o compartilhamento de ações e serviços de saúde, mas também de bens e serviços, transportes, trabalho e educação, segundo designação do Instituto de Geografia e Estatística (IBGE), formando aglomerados municipais, com uma cidade-polo de regência num determinado lócus regional (IBGE, 2017). Estas regiões são primordiais para descrever as ofertas da RAPS no Brasil.

Desse modo, torna-se importante avaliar o dimensionamento assistencial da RAPS em todo o território nacional, baseado nas características locorregionais do Brasil. Esta pesquisa é desenhada sob a hipótese de que, apesar do caráter nacional da RAPS, a oferta e distribuição dos serviços que a compõem não acontecem de maneira homogênea no Brasil, já que o país tem dimensões continentais e marcantes discrepâncias socioeconômicas, demográficas e culturais, dividido em governanças de saúde distintas. Dessa forma, o objetivo deste estudo foi analisar a distribuição espacial da estrutura e dos recursos humanos que compõem a Atenção Psicossocial no Brasil por Regiões Imediatas de Articulação Urbana.

Método

Trata-se de um estudo ecológico, que considerou como unidades analíticas as 482 Regiões Imediatas de Articulação Urbana (RIAU), que são estruturas a partir de aglomerados de centros urbanos que interagem para atender às demandas populacionais por serviços de saúde, educação e bens de consumo, além da busca por trabalho (Oliveira, Neill, & Silva, 2017).

Para avaliação da oferta de estrutura e de recursos humanos da RAPS, foram coletados dados disponíveis nas páginas eletrônicas do Departamento de Informática do SUS (DATASUS), a partir da base do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), e no site do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que forneceu a base de dados geográficos das RIAU no Brasil. A busca das informações teve como referência o mês de junho de 2018.

A estrutura da RAPS compreendeu a análise de 27 indicadores, a saber: Equipes de Estratégia de Saúde da Família (ESF), Equipes dos Núcleos Ampliados da Saúde da Família (NASF I, II e III); Unidades Básicas de Saúde (UBS); Consultórios na Rua (CR); Centros de Atenção Psicossocial (CAPS I, II, III, AD, AD III e i); Unidade de Acolhimento Adulto; Unidade de Acolhimento Infanto-Juvenil; Pronto Atendimentos; Equipes do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU); Leitos Hospitalares em Hospital Dia e em Hospital Psiquiátrico; Hospital Geral, Hospital Dia e Hospital Especializado; Pronto Socorro Especializado e Pronto Socorro Geral, Residências Terapêuticas, Serviço Residencial Terapêutico Tipo I, Serviço Residencial Terapêutico Tipo II e Unidade de Atenção em Regime Residencial.

Em relação aos Recursos Humanos, foram analisados nove indicadores acerca da distribuição de categorias profissionais: Agentes Comunitários de Saúde (ACS); Enfermeiros; Técnicos de Enfermagem; Auxiliares de Enfermagem; Assistentes Sociais; Psicólogos; Terapeutas Ocupacionais (TO); Médicos da Família e Médicos Psiquiatras.

Para o cálculo do indicador de oferta, tanto de estrutura quanto de recursos humanos, dividiu-se o quantitativo de cada um desses componentes pelo total da população residente em cada RIAU em junho de 2018, multiplicado por 1.000 habitantes (n. oferta/população 2018 * 1.000 habitantes). A única exceção deste cálculo foi o indicador de oferta do SAMU, para o qual se usou a base de 1.000.000 de habitantes.

Foi realizada a análise descritiva através das Medidas de Tendência Central (Média e Mediana), das Medidas de Dispersão (Mínimo, Máximo, Desvio-Padrão) e de Posição (Percentis 25 e 75), seguida da análise de distribuição espacial (descritiva e inferencial) por RIAU no Brasil.

Para a distribuição espacial, as variáveis foram padronizadas (em escore Z), e cada variável foi analisada por quintis. A legenda das figuras expressa a classificação da área em relação à média encontrada para cada variável, sendo descritas da seguinte forma: Valores Médios; Inferior à Média; Muito Inferior à Média; Superior à Média; Muito Superior à Média. Com estes resultados, foram produzidos mapas temáticos, nos quais a maior intensidade das cores representa o pior nível de oferta.

A análise de dependência espacial foi executada através do Índice de Moran Global (I), utilizando o teste de permutação aleatória, com 99 permutações, podendo variar entre -1 e +1, e que estimou a autocorrelação espacial, além de fornecer a significância estatística (valor de p). A análise de dependência espacial considerou o Índice de Moran Global a partir de 0,4 e valor de p<0,05 para fins de autocorrelação moderada e significativa. Desta forma, pôde-se considerar que as variáveis cujo índice mencionado foi I≥0,4 estão autocorrelacionadas no espaço e, portanto, foram analisadas pelos indicadores do Moran Local. Por meio do Moran Local (Local Indicators of Spatial Association [LISA]), foi construído o MoranMap (Bezerra et al., 2019).

Nunes (2013) diz que, em relação à hipótese, o índice de Moran Global traz o H0 como a independência espacial, e a H1, dependência espacial. Então, para confirmar a hipótese nula, o valor de Moran é zero. Após verificar a hipótese de dependência espacial, os valores de Moran podem ser positivos ou negativos. Quando positivos (entre 0 e +1), a correlação é direta, os valores semelhantes tendem a se localizar vizinhos, ou seja, os valores baixos têm tendência a estarem localizados próximos a valores baixos e os valores altos vizinhos aos valores altos (Alto-Alto e Baixo-Baixo). Quando negativos (-1 e 0), existe correlação inversa, na qual os valores altos estarão vizinhos dos valores baixos e os valores baixos cercados por valores altos (Alto-Baixo e Baixo-Alto), sendo consideradas áreas de transição.

Os resultados do MoranMap, considerando como formação de cluster apenas os aglomerados com valor de p<0,05, foram expressos de acordo com a intensidade da aglomeração dos indicadores nas áreas analisadas, sendo descritos como: Baixo-Baixo; Alto-Alto; Baixo-Alto; Alto-Baixo e “Áreas sem Significância Estatística”.

Para a produção dos mapas temáticos em quintis e o cálculo do Índice de Moran Global e Local, foi utilizado o software Terraview 4.2.2. Para a preparação e organização das tabelas do CNES, foi utilizado o software Tabwin 3.6. Para a análise descritiva, foi utilizado o software Statistical Package for the Social Sciences versão 25.0 (SPSS-25).

Nesta pesquisa, foram utilizados dados secundários extraídos de sites oficiais abertos à consulta pública. Dessa forma, não houve necessidade de apreciação do Comitê de Ética e Pesquisa (CEP), como preconiza a Resolução n. 466∕2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS).

Resultados

A análise inicial foi realizada com 36 variáveis que representam a estrutura e os profissionais que compõem a RAPS (Tabela 1). A análise descritiva dessas variáveis indica que, para algumas, o valor da Mediana e do Percentil 75 é zero. Isso é observado para as variáveis: “Consultórios na Rua”, “Pronto Socorro Especializado”, “Leitos em Hospital Dia”, “Residências Terapêuticas”, “Serviço Residencial Terapêutico Tipo I”, “Serviço Residencial Terapêutico Tipo II”, “Unidades de Acolhimento Infanto-Juvenil e Adulto”, “Unidade de Atenção em Regime Residencial”, “CAPS III” e “CAPS AD III”.

Tabela 1

Análise descritiva das 36 variáveis (1.000 hab.) de estrutura e recursos humanos que compõem a Rede de Atenção Psicossocial no Brasil (RAPS)

VARIÁVEIS

Mínimo

Máximo

Média

Mediana

Desvio-padrão

Percentil 25

Percentil 75

Equipes de ESF

0,000

0,291

0,079

0,074

0,051

0,042

0,111

Equipes do NASF I

0,000

0,067

0,020

0,018

0,015

0,009

0,031

Equipes do NASF II

0,000

0,083

0,010

0,007

0,012

0,000

0,015

Equipes do NASF III

0,000

0,145

0,017

0,006

0,027

0,000

0,022

Consultórios na Rua

0,000

0,762

0,034

0,000

0,100

0,000

0,000

Equipes da SAMU*

0,000

159,014

23,575

21,161

20,039

10,196

32,396

UBS

0,053

0,519

0,264

0,271

0,089

0,195

0,325

Hospital Especializado

0,000

0,025

0,002

0,000

0,004

0,000

0,003

Hospital Geral

0,008

0,177

0,038

0,033

0,022

0,023

0,045

Hospital Dia

0,000

0,027

0,002

0,000

0,003

0,000

0,002

Pronto Atendimento

0,000

0,066

0,006

0,005

0,008

0,000

0,009

Pronto Socorro Especializado

0,000

0,014

0,000

0,000

0,001

0,000

0,000

Pronto Socorro Geral

0,000

0,043

0,002

0,000

0,005

0,000

0,002

Leitos em Hospital Dia

0,000

0,566

0,005

0,000

0,032

0,000

0,000

Leitos Psiquiátricos

0,000

2,551

0,106

0,013

0,256

0,000

0,099

Residências Terapêuticas

0,000

0,011

0,000

0,000

0,001

0,000

0,000

Serviço Residencial Terapêutico Tipo I

0,000

0,026

0,001

0,000

0,002

0,000

0,000

Serviço Residencial Terapêutico Tipo II

0,000

0,043

0,001

0,000

0,003

0,000

0,000

Unidade de Acolhimento Adulto

0,000

4,033

0,087

0,000

0,332

0,000

0,000

Unidade de Acolhimento Infanto-Juvenil

0,000

0,012

0,000

0,000

0,001

0,000

0,000

Unidade de Atenção em Regime Residencial

0,000

0,008

0,000

0,000

0,000

0,000

0,000

CAPS TIPO I

0,000

0,085

0,013

0,011

0,011

0,005

0,018

CAPS TIPO II

0,000

0,026

0,003

0,002

0,004

0,000

0,004

CAPS TIPO III

0,000

0,018

0,000

0,000

0,001

0,000

0,000

CAPS AD

0,000

0,022

0,002

0,000

0,003

0,000

0,003

CAPS AD III

0,000

5,000

0,143

0,000

0,493

0,000

0,000

CAPS Infanto-Juvenil

0,000

0,022

0,001

0,000

0,003

0,000

0,001

Médicos da Família

0,075

1,289

0,313

0,315

0,105

0,237

0,374

Psiquiatras

0,000

0,411

0,080

0,063

0,063

0,035

0,110

Enfermeiros

0,463

3,272

1,209

1,163

0,363

0,961

1,386

Assistente Social

0,000

0,799

0,169

0,157

0,076

0,120

0,204

Psicólogos

0,039

1,525

0,350

0,313

0,203

0,184

0,489

Terapeutas Ocupacionais

0,000

0,286

0,048

0,038

0,042

0,018

0,066

Auxiliar de Enfermagem

0,000

0,562

0,128

0,094

0,113

0,040

0,184

Técnico de Enfermagem

0,225

9,817

2,296

2,125

1,033

1,610

2,825

Agentes Comunitários de Saúde

0,400

4,283

1,881

1,956

0,627

1,418

2,378

* por 1.000.000 hab.

Houve maior concentração de profissionais Psicólogos, Psiquiatras e Terapeutas Ocupacionais nas regiões Sul e Sudeste do Brasil. Já para as variáveis “Médico da Família” e “ACS”, os maiores valores foram registrados para a região Nordeste (Figura 1). A desigualdade também se expressa na distribuição da estrutura da RAPS, principalmente no que diz respeito à distribuição dos CAPS I, UBS, SAMU, Hospital Geral, Pronto Atendimento e Leitos Psiquiátricos, exemplificada com mapas coloridos a partir dos níveis “muito inferior” e “inferior”. Por outro lado, vê-se que há similaridade na distribuição de outros serviços, quais sejam: CAPS II, CAPS AD, CAPS i, Pronto Socorro Geral, Hospital Dia e Hospital Especializado (Figura 2).

Figura 1. Distribuição dos Serviços e dos Profissionais que compõem a Rede de Atenção Psicossocial por Região Imediata de Articulação Urbana no Brasil. A- Médicos de Família; B- Enfermeiros; C- Psicólogos; D- Psiquiatra; E- Terapeuta Ocupacional; F- Assistente Social; G- Técnico de Enfermagem; H- Agente Comunitário de Saúde; I- Equipes de Estratégia de Saúde da Família; J- Equipes de NASF I; K-Equipes de NASF II; L- Equipes de NASF III.

Ademais, um dos resultados de maior destaque é a precariedade na oferta tanto de grande parte das categorias profissionais quanto de vários pontos de assistência integrantes da RAPS na região Norte do Brasil. Fato bem evidente para as variáveis Médicos da Família, Psicólogos, Psiquiatra, Terapeuta Ocupacional, ACS, Equipes ESF e Equipes NASF em suas três modalidades (Figura 1), juntamente da UBS, CAPS I e Hospital Geral (Figura 2).

Figura 2. Distribuição da Estrutura que compõe a Rede de Atenção Psicossocial por Região Imediata de Articulação Urbana no Brasil. A- UBS; B- SAMU; C- CAPS I; D- CAPS II; E- CAPS AD; F- CAPSi; G- Pronto Socorro Geral; H- Leitos Psiquiátricos; I- Hospital Geral; J- Hospital Dia; K- Hospital Especializado; L- Pronto Atendimento.

Na análise da dependência espacial, verifica-se que houve formação de Clusters para as variáveis: “Médicos/1.000 hab.”, “Psiquiatras/1.000 hab.”, “Psicólogos/1.000 hab.”, “Terapeuta ocupacional/1.000 hab.”, “UBS/1.000 hab.” e “Hospital Geral/1.000 hab.”, “ACS/1.000 hab.” e “NASF I/1.000 hab.”, quando consideramos o índice de Moran Global I>0,400 (Figuras 1 e 2). As variáveis que não apresentaram autocorrelação espacial foram: Consultórios na Rua (I=0,05); Hospital Especializado (I=0,039); Pronto Socorro Especializado (I=0,001); Leitos em Hospital Dia (I=0,005); Residências Terapêuticas (I=0,007); Serviço Residencial Terapêutico Tipo I (I=0,081); Unidade de Acolhimento Adulto (I=0,0006); Unidade de Acolhimento Infanto-Juvenil (I=0,045); Unidade de Atenção em Regime Residencial (I=0,004); CAPS I (I=0,098); CAPS II (I=0,029); CAPS III (I=0,056); CAPS AD (I= 0,039); CAPS AD III (I=0,010).

A análise do Moran Map mostra que os aglomerados de elevada oferta para as variáveis “ACS”, “Médicos da Família”, “UBS” e “NASF I” estão localizadas no Nordeste do Brasil. Já para as variáveis “Psicólogos”, “Psiquiatras” e “Terapeuta Ocupacional”, os clusters de elevada oferta estão localizados no Sudeste e parte do Sul (Figura 3).

Figura 3. Distribuição espacial dos clusters das taxas com LISA estatisticamente significativo (MoranMap). A- ACS; B- Médicos; C- UBS; D- Psicólogos; E- Psiquiatras; F- Terapeuta Ocupacional; G- Hospital Geral; H- NASF I.

Discussão

Os resultados do presente estudo demonstram que os serviços e os recursos humanos que compõem a RAPS estão desigualmente distribuídos entre as RIAU no Brasil. Há escassez da oferta na região Norte do Brasil, caracterizada como um vazio assistencial; por outro lado, há concentração de algumas categorias profissionais como Psicólogos, Psiquiatras e Terapeutas Ocupacionais nas regiões Sudeste e Sul do Brasil, enquanto a oferta do aparato da Atenção Primária é mais acentuada no Nordeste brasileiro.

Embora tenham sido registrados avanços na implantação dos serviços da RAPS a partir de 2011, a ampliação dos pontos de apoio em saúde mental e a diversidade dos serviços implantados nas regiões do país, ainda persistem diferenças regionais importantes (Dimenstein, Paulo Macedo, Gomes, Da Silva, & Marinho, 2018). Apesar da potencialidade da proposta de regionalização da saúde, sua efetivação enfrenta importantes obstáculos, entre eles, a institucionalização de uma rede de atenção homogênea num território heterogêneo, composto por entes autônomos e marcado por forte disputa política (Santos & Giovanella, 2014; Viana et al., 2015).

A distribuição geográfica da capacidade instalada em saúde nos países em desenvolvimento é marcada por amplas disparidades regionais e, geralmente, essas barreiras são impostas pela indisponibilidade da oferta de serviços básicos e especializados à grande maioria da população. A rede urbana de serviços de saúde no Brasil é, ao mesmo tempo, não inclusiva, sobreposta, amplamente desigual na distribuição regional e concentrada nas regiões Sudeste e Sul do Brasil. Observam-se a existência de grandes áreas de deficiências, obsoletas em equipamentos, instalações físicas e recursos humanos, além de um sistema de cidades poroso, com a virtual inexistência de centros urbanos de hierarquia intermediária (Guimarães, Pedro, & Rodrigo, 2007). Esse fato ficou explicitado pela pesquisa que analisou a distribuição espacial de um indicador sintético da oferta dos serviços públicos de saúde nos municípios brasileiros, mostrando a existência de clusters do tipo Alto-Alto e Alto-Baixo principalmente nas regiões de saúde do Sudeste, Sul e Nordeste do Brasil, nas capitais dos estados e em municípios considerados polos de atenção à saúde (Afonso & Perobelli, 2018).

Em seus achados, esta pesquisa reafirma os resultados de estudos anteriores, indicando que, apesar da ampliação da taxa de crescimento e cobertura da RAPS em todo o país, em termos da distribuição de serviços do tipo Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), Serviço Residencial Terapêutico (SRT), Unidades de Acolhimento (UA) e Leitos de Saúde Mental em Hospital Geral, existem áreas em situação crítica, que contam com apenas um ponto de atenção da RAPS (serviços como equipes de ACS, ESF e/ou NASF) (Dimentein et al., 2018). A pesquisa de Macedo et al. (2017) registrou que, em todo o país, 17 municípios não contam com ACS atuando nos respectivos territórios; desses, 12 estão localizados no estado de São Paulo; e dos 31 municípios que não contam com quaisquer equipes de Saúde da Família, 22 também são paulistas. Ademais, existem 17 municípios no Brasil que não contam com equipamento algum da APS (ACS, ESF e NASF) em seu território: 12 localizados no estado de São Paulo e cinco no Rio Grande do Sul. Corroborando com a ideia da escassez e desigualdade na distribuição da RAPS no Brasil, esta mesma pesquisa ainda mostrou que havia apenas 362 Serviços de Residência Terapêutica em funcionamento no país, concentrados nas capitais/regiões metropolitanas dos estados do Sudeste e Nordeste (Macedo et al., 2017).

Outro desafio enfrentado para a consolidação da RAPS no contexto brasileiro é o de implantação dos leitos de psiquiatria nos Hospitais Gerais (HG), principalmente em função dos espaços físicos inadequados aos moldes da Reforma Psiquiátrica, além da escassez de equipe técnica multiprofissional preparada para Atenção Psicossocial em ambiente hospitalar. Dentre as barreiras que dificultam a inserção e sistematização da psiquiatria nos HG, destacam-se: escassez da oferta de leitos, por parte da instituição, de cursos de formação para esta área; ou ainda a falta de identificação dos trabalhadores com a psiquiatria, corroborando com situações de negligência ou adoção de condutas inadequadas (Paes, Silva, Chaves, & Maftum, 2013).

Vale ressaltar que, na atual conjuntura, o Brasil também é marcado por mudanças na constituição destes serviços de saúde mental. A nota n. 11/2019-CGMAD/DAPES/SAS/MS inclui novos serviços para a RAPS, como a implementação de Ambulatório Multiprofissional de Saúde Mental − Unidades Ambulatoriais Especializadas; Hospital Psiquiátrico; e Hospital Dia (Brasil, 2017). A proposta da reinserção dos hospitais psiquiátricos gerou intensas discussões por parte da sociedade e pelos defensores da luta antimanicomial, que alegam que isso representa um retrocesso para a atenção psicossocial, pois a nota técnica vai contra os pressupostos da reforma psiquiátrica, segundo a lei 10.216, de 2001. Esta lei inclui a volta da estratégia de hospitalização, excluindo indivíduos com transtornos mentais da sociedade. Além disso, pesquisadores alegam que isto fere outros princípios da atenção psicossocial, como o respeito aos direitos humanos, garantia de autonomia, liberdade e exercício da autonomia. Logo, estas propostas apontam para um possível desmonte do SUS, no qual atacam seus princípios e diretrizes seguindo tendências de privatizações e desobedecendo a direitos constitucionais (Lussi et al., 2019; Guimarães & Rosa, 2019).

Quanto às desigualdades regionais, a precariedade de oferta da RAPS na região Norte do país é um dos destaques do presente estudo. Fazendo o contraponto entre a oferta do serviço e a assistência à saúde, o trabalho de Lopes, Hellwig, Silva e Menezes (2016) analisou as desigualdades no acesso ao tratamento da depressão no Brasil, com dados provenientes da Pesquisa Nacional de Saúde de 2013. Este mostrou que a proporção de indivíduos que tinham diagnóstico de depressão e que não receberam tratamento para essa doença foi de quase 80%, e que a região Norte teve a maior proporção de indivíduos não tratados (acima de 90%). A região Norte tem se destacado também pelo aumento das taxas de suicídio nas últimas décadas. O estudo de Machado & Santos (2015) mostrou que, entre os anos 2000 e 2012, a taxa de mortalidade por esta causa na região Norte cresceu 37,2%, passando de 3,8 para 5,3 óbitos por 100.000 habitantes no período estudado.

O estudo de Macedo et al. (2017) analisou a organização da RAPS a partir da constituição das Regiões e Redes de Atenção à Saúde no Brasil e mostrou que os estados das regiões Centro-Oeste e Norte destacam-se pela menor quantidade de equipes da Atenção Primária à Saúde (APS). De fato, a consistência dessas afirmações explica os achados do presente trabalho, detectando as áreas passíveis de intervenção pelas autoridades sanitárias, com vistas ao seu futuro aperfeiçoamento.

Outra questão a ser enfrentada em prol da consolidação da RAPS no Brasil é a distribuição dos profissionais e a definição do seu papel dentro da Atenção Psicossocial. A distribuição geográfica dos profissionais Psiquiatras, Psicólogos e Terapeutas Ocupacionais no Brasil apresenta-se como uma barreira a ser ultrapassada, e, para a consecução de uma oferta equânime, os desafios vão desde a formação até a oportunidade de mercado de trabalho.

Segundo o Atlas de Demografia Médica no Brasil, a Psiquiatria ocupa a 10ª posição como a primeira opção para residência médica, com registro de 10.396 médicos psiquiatras no território nacional, representando 2,7% dos médicos no país. Logo, existe a taxa de cinco psiquiatras para cada 100 mil habitantes, número bastante inferior à média de países desenvolvidos e em desenvolvimento (Scheffer et al., 2018). Já em relação aos profissionais da psicologia inseridos no mercado de trabalho no Brasil, em 2014, equivalia a 146.721 psicólogos, com cerca de 80% deste contingente localizado nas regiões Sul e Sudeste (Dieese, 2016). Em relação aos Terapeutas Ocupacionais, embora tenha havido uma expansão de cursos de graduação no país, atualmente, há apenas 0,9 Terapeuta Ocupacional para cada 10 mil habitantes no país, considerado um valor inferior à média mundial, que é de dois profissionais para cada 10 mil habitantes (Mariotti et al., 2016).

É importante ressaltar também que há grande rotatividade de profissionais nos serviços que compõem a RAPS, considerando a pouca adesão e procura pela área, o que reflete, em parte, o preconceito de alguns profissionais, bem como a desvalorização, os poucos investimentos das políticas públicas e a falta de condições de trabalho. Soma-se, também, o processo de formação, com disciplinas em saúde mental de carga horária teórico-prática insuficientes, ou mesmo a falta de articulação entre o currículo e a realidade encontrada nos serviços de saúde (Santos, Pessoa Junior, & Miranda, 2018).

No entanto, apesar de todas as dificuldades de estrutura e de profissionais, a portaria GM/MS n. 3588, de 2017, expõe que as equipes multiprofissionais de atenção especializada em saúde mental (AMENT) devem integrar não apenas aos serviços da RAPS, mas de todas as redes de atenção em saúde. As AMENT também devem se integrar em municípios de pequeno porte, que ainda não têm os centros de atenção psicossocial, ampliando o acesso à saúde mental para as pessoas de todas as faixas etárias (Brasil, 2017). Mas, como visto na rotina dos serviços de saúde, essa realidade ainda não foi colocada em prática.

As disparidades regionais na organização e disponibilidade da oferta de recursos humanos e serviços que compõem a RAPS se refletem no perfil epidemiológico da população brasileira. Os resultados do Estudo de Carga Global de Doenças no Brasil, em 2015, apontam que os Transtornos Mentais são a terceira causa de carga de doença no país, atrás apenas das doenças cardiovasculares e dos cânceres. Esse estudo mostra ainda que anos de vida perdidos por morte ou incapacidade por estas causas passou da sexta para a terceira posição, indicando maior gravidade da situação de saúde mental no país, principalmente porque foi detectada alta carga dos transtornos mentais que ocorrem na infância e adolescência, o que reforça a necessidade de serviços de prevenção e tratamento voltados especificamente a esta faixa etária, atualmente pouco disponíveis no Brasil (Bonadiman, Passos, Mooney, & Melo 2017).

Quanto aos serviços de saúde mental voltados para crianças e adolescentes, os Centros de Atenção Psicossocial Infanto-Juvenis (CAPSi) são indispensáveis para o atendimento à população, o acompanhamento clínico e a inserção social dos usuários, tendo como funções a atenção diária, o acolhimento, cuidado clínico e a inserção social. No entanto, a rede atual de CAPSi ainda é insuficiente e desigualmente distribuída. Sendo um serviço público predominantemente municipal, pode-se atribuir tal situação à ausência de decisão política e de investimento para ampliação dos serviços, além da escassez de psiquiatras gerais e de especialistas em psiquiatria infantojuvenil. Esses profissionais situam-se em grandes centros urbanos, principalmente na região Sudeste, onde se concentram 76% das residências em psiquiatria (Garcia, Santos, & Machado, 2015).

Outro ponto para a configuração de redes integradas e regionalizadas refere-se ao subfinanciamento do setor público, à forte dependência do setor privado, à dificuldade de colaboração entre os municípios que estão sempre em conflito e competição, bem como à multiplicidade de instâncias responsáveis pela coordenação (Macedo et al., 2017). É importante destacar que o financiamento das redes temáticas no Brasil, a exemplo da RAPS, além de favorecer o modelo médico assistencial, por meio da transferência de recursos prioritariamente destinados ao cuidado em saúde de média e alta complexidade, parece tender às regiões privilegiadas, pois, em grande parte, exige capacidade burocrática e financeira previamente existentes (Duarte & Mendes, 2018). Essas disparidades agravam ainda mais as diferenças locorregionais, aprofundando os abismos da oferta de serviços e profissionais quando se comparam o Sul-Sudeste ao Norte-Nordeste do Brasil.

Diante de toda explanação apresentada, pode-se constatar o quanto a RAPS é complexa, tanto em sua proposta conceitual como em função da implantação dos seus serviços substitutivos e, principalmente, no processo de implementação das práticas antimanicomiais. Ademais, os achados alertam para a necessidade de se perceber que a distribuição espacial da estrutura e recursos humanos da rede analisada potencializa as desigualdades em saúde já existentes entre as regiões e vulnerabiliza as populações mais dependentes do serviço público de saúde.

As limitações deste estudo se referem à utilização de dados provenientes do Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde (CNES) e em um período específico, já que as informações são o resultado do preenchimento de formulários, sendo passíveis a eventuais inconsistências nas bases de dados. No entanto, Rocha et al. (2018) apontam que a utilização dessas informações permite obter dados precisos sobre uma grande quantidade de serviços, com a potencialidade de caracterizá-los quanto a sua infraestrutura, credenciamentos, localização e características de recursos humanos, possibilitando a instrumentalização dos gestores em saúde, com dados capazes de subsidiar decisões baseadas em evidências.

Conclusão

Além de analisar a oferta de serviços da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), esta pesquisa trouxe a realidade distributiva de outros tantos dispositivos de saúde comuns às demais redes de assistência, nas quais também estão inseridos os serviços de Atenção Primária, como as UBS e os NASF; da Atenção Secundária, no caso dos Pronto Atendimentos; e da Atenção Terciária, a exemplo do SAMU e dos Hospitais Gerais, todos estes analisados nesta produção.

Este estudo parte da perspectiva de que os fluxos de conexão, considerados como modo de funcionamento da atenção em saúde mental, estão na responsabilidade da força da ação dos trabalhadores, segundo a ideia de que todos são protagonistas no processo de cuidado, e, dessa forma, a consolidação da RAPS perpassa pela oferta equânime desses recursos humanos no território brasileiro. Ademais, é necessário apontar que esta pesquisa também inclui a reflexão acerca da necessidade de implementação de capacitações multiprofissionais na área de saúde mental, além de programas de incentivo para fixação destes profissionais nas equipes, evitando ausência ou ampla rotatividade destes. Outrossim, como também visto, é necessário um avanço em termos de estrutura física para muitos municípios conseguirem obter uma RAPS de qualidade.

Estudos que abordem de forma sistemática a avaliação da RAPS, as relações entre os serviços dessa rede e o perfil epidemiológico em saúde mental da população brasileira poderão elucidar as formas sob as quais o papel dessa rede temática é ou não exercido, subsidiando reformulações e acertos de rumo das políticas vigentes para a área, visando ao incremento de sua eficácia.

Logo, ressaltamos a necessidade de formulação de indicadores que utilizem múltiplas fontes de dados e que sejam capazes de expressar, também, aspectos qualitativos da Atenção Psicossocial em nível populacional, bem como conhecer o dinamismo da RAPS, através de seus trabalhadores e usuários, considerando a sua complexidade como rede de serviços e todos os pontos que a compõem.

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Recebido em: 12/11/2019

Última revisão: 24/04/2020

Aceite final: 27/04/2020

Sobre os autores:

Murielly Priscilly de Medeiros Maia: Mestra em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Graduada em Enfermagem pela UFRN. Enfermeira assistencial do Centro de Atenção Psicossocial tipo I, do município de Santa Luzia, PB. E-mail: muriellypriscilly@hotmail.com, Orcid: http://orcid.org/0000-0002-0903-8975

Ana Kalliny de Sousa Severo: Doutora em Saúde Coletiva pela Universidade Estadual de Campinas. Graduada em Psicologia. Professora do curso de pós-graduação em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). E-mail: kallinysevero@yahoo.com.br, Orcid: http://orcid.org/0000-0002-9548-6394

Wilton Rodrigues Medeiros: Doutor em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Graduado em Odontologia pela UFRN. Professor do Programa de Pós-Graduação em Gestão da Qualidade em Serviços de Saúde da UFRN. E-mail: wilrnodonto@yahoo.com.br, Orcid: http://orcid.org/0000-0002-9096-8108

Yan Nogueira Leite de Freitas: Doutor em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Graduado em Odontologia pela UFRN. Professor da Faculdade de Odontologia da Universidade Federal do Amazonas. E-mail: nlfyan@hotmail.com, Orcid: http://orcid.org/0000-0002-5843-4878

Héllyda de Souza Bezerra: Doutora em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Graduada em enfermagem pela UFRN. Enfermeira assistencial da Secretaria do Estado do Rio Grande do Norte (SESAP/RN). E-mail: hellydasbezerra@hotmail.com, Orcid: http://orcid.org/0000-0002-2747-4981

Roberta Machado Alves: Mestra em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Graduada em Psicologia pela UFRN. Psicóloga do Centro de Atenção Psicossocial tipo I, do município de Extremoz, RN. E-mail: psirobertaalves@gmail.com, Orcid: http://orcid.org/0000-0003-1697-1015

Isabelle Ribeiro Barbosa: Doutora em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Graduada em Farmácia pela UFRN. Professora do curso de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da UFRN. E-mail: isabelleribeiro68@gmail.com, Orcid: http://orcid.org/0000-0002-1385-2849


1 Endereço de contato: Av. Capitão Mor Golveia, 2488, Condomínio Smile Lagoa Nova, CEP: 59070-400, Natal, RN. Tel.: (84) 99666-8715. E-mail: hellydasbezerra@hotmail.com

doi: http://dx.doi.org/10.20435/pssa.v13i4.1189