Procrastinação Acadêmica: Contribuições de Variáveis Demográficas e da Ansiedade Cognitiva de Provas em Universitários Brasileiros
Academic Procrastination: Contributions of Demographic Variables and Cognitive Test Anxiety in Brazilian University Students
Procrastinación Académica: Contribuciones de las Variables Demográficas y la Ansiedad Cognitiva de los Exámenes en Estudiantes Universitarios Brasileños
Gleyde Raiane de Araújo
Gustavo Oliveira de Araujo
Faculdade Ieducare (FIED)
Paulo Gregório Nascimento da Silva
Universidade de Fortaleza (UNIFOR)
André Sousa Rocha
Jocélia Medeiros Ximenes
Centro Universitário Inta (UNINTA)
Laís Renata Lopes da Cunha
Paloma Cavalcante Bezerra de Medeiros
Emerson Diógenes de Medeiros
Universidade Federal do Delta do Parnaíba (UFDPar)
Resumo
O presente estudo teve como objetivo verificar em que medida a ansiedade cognitiva de provas explica a procrastinação acadêmica, controlando o efeito influência das variáveis sexo e idade, em universitários da região Nordeste. A amostra contou com 570 universitários (Midade = 22,43; DP = 5,43; com idades variando de 18 a 56 anos). Esses eram em maioria mulheres (59,5%), de instituições públicas (59,8%), que cursavam em maioria Psicologia (41,8%) e Fisioterapia (11,1%). Utilizou-se a Escala de Ansiedade Cognitiva de Provas, a Escala de Procrastinação de Tuckman e questionário sociodemográfico. Por meio do SPSS, foram realizadas análises de correlação e regressão linear hierárquica. Os resultados indicaram que ansiedade cognitiva de provas e idade contribuíram para a explicação da procrastinação acadêmica, não sendo significativa a contribuição da variável sexo. No modelo final, o conjunto de variáveis explicou 18% da variação total. Conclui-se que o componente cognitivo da ansiedade de provas funciona como fator de risco para o comportamento procrastinador no contexto acadêmico, principalmente em universitários mais jovens.
Palavras-chave: ansiedade de provas, procrastinação, universitários
Abstract
The present study aimed to investigate the extent to which cognitive test anxiety explains academic procrastination, while controlling for the influence of gender and age variables, among university students in the Northeast region. A sample of 570 university students (Mage = 22.43; SD = 5.43; ranging from 18 to 56 years old) was included. The majority were women (59.5%), enrolled in public institutions (59.8%), with Psychology (41.8%) and Physiotherapy (11.1%) being the most common majors. The Test Anxiety Scale, Tuckman Procrastination Scale, and a sociodemographic questionnaire were used. Correlation and hierarchical linear regression analyses were conducted using SPSS. The results indicated that cognitive test anxiety and age contributed to explaining academic procrastination, with the contribution of the gender variable not being significant. In the final model, the set of variables explained 18% of the total variation. It is concluded that the cognitive component of test anxiety serves as a risk factor for procrastination behavior in the academic context, particularly among younger university students.
Keywords: test anxiety, procrastination, university students
Resumen
El presente estudio tuvo como objetivo verificar en qué medida la ansiedad cognitiva ante los exámenes explica la procrastinación académica, controlando el efecto de las variables de género y edad, entre estudiantes universitarios en la región Nordeste. Se contó con una muestra de 570 estudiantes universitarios (Medad = 22,43; DP = 5,43; con edades que oscilan entre 18 y 56 años). La mayoría eran mujeres (59,5%), matriculadas en instituciones públicas (59,8%), y cursaban principalmente Psicología (41,8%) y Fisioterapia (11,1%). Se utilizaron la Escala de Ansiedad ante los Exámenes Cognitivos, la Escala de Procrastinación de Tuckman y un cuestionario sociodemográfico. Se realizaron análisis de correlación y regresión lineal jerárquica utilizando SPSS. Los resultados indicaron que la ansiedad cognitiva ante los exámenes y la edad contribuyeron a explicar la procrastinación académica, sin que la contribución de la variable de género fuera significativa. En el modelo final, el conjunto de variables explicó el 18% de la variación total. Se concluye que el componente cognitivo de la ansiedad ante los exámenes funciona como un factor de riesgo para el comportamiento procrastinador en el contexto académico, especialmente entre estudiantes universitarios más jóvenes.
Palabras-clave: ansiedad por los exámenes, procrastinación, estudiantes universitarios
Introdução
A inserção no ensino superior conduz o estudante a uma nova configuração social e acadêmica, resultando em alterações que geram estresse e impactos psicológicos negativos (Kuftyak, 2021). Dito isso, sabe-se que, em contextos acadêmicos, especialmente os universitários, podem suscitar emoções negativas, como a ansiedade; principalmente em situações específicas, como as que envolvem avaliações ou provas. Isso pode funcionar como fator de risco para comportamentos desadaptativos, como a procrastinação (Silva et al., 2023; Yang et al., 2021), configurando-se como um desafio comum entre os estudantes e causando problemas significativos, como o fracasso acadêmico (Bolbolian et al., 2021).
Nesse sentido, a procrastinação é considerada um fenômeno psicológico contemporâneo, definido como a propensão do indivíduo a adiar e postergar a finalização de projetos e tarefas importantes (Silva et al., 2023). Isso pode causar danos tanto na vida profissional e acadêmica quanto pessoal (Ranđelović et al., 2021). Nesse sentido, estima-se que entre 50% e 90% dos estudantes universitários são propensos a essa conduta (Kuftyak, 2021).
A Procrastinação Acadêmica (PA) refere-se a uma característica situacional, que ocorre em um domínio específico, ou seja, no contexto acadêmico universitário (Ocansey et al., 2022). A PA pode ser definida como um atraso irracional ou adiamento voluntário para o início e/ou conclusão de tarefas acadêmicas importantes, mesmo sabendo que são necessárias, previstas e com um prazo específico para sua conclusão (González-Brignardello et al., 2023; Silva et al., 2023). Devido a isso, a PA é considerada uma falha no processo de regulação comportamental, que se relaciona aos mecanismos de autocontrole e disciplina diante dos estudos (González-Brignardello et al., 2023). Esse comportamento pode ser prejudicial para o bem-estar e desenvolvimento do estudante, uma vez que compromete o desempenho e o sucesso da atividade em execução (Rahimi et al., 2023).
Essa conduta é compreendida como uma resposta de evitação às emoções negativas, a exemplo da ansiedade (Oflazian & Borders, 2023), que, em âmbito universitário, é comumente expressa em contextos avaliativos ou de provas acadêmicas (Silva et al., 2023). Especificamente, a Ansiedade de Prova (AP) se refere a um tipo específico de sintomatologia ansiosa (situacional), apresentando-se como um estado afetivo transitório que é evocado apenas em situações específicas de provas (Tan & Pang, 2023), e nas quais a avaliação do desempenho é percebida pelo indivíduo como ameaçadora (Huntley et al., 2022).
Em suma, a AP é considerada um construto multifacetado, abrangendo aspectos como: a) cognitivo, referente a pensamentos sobre um possível fracasso ou mau desempenho nas provas), b) emocional, que inclui reações fisiológicas, tensão, agitação emocional e ansiedade, e c) comportamental, que inclui comportamentos realizados antes e durante a situação de prova que levam ao declínio do desempenho (Bolbolian et al., 2021). Nesse contexto, são manifestados tanto os comportamentos relevantes para a tarefa (por exemplo, focar a atenção na tarefa) quanto o comportamento irrelevante para a tarefa (por exemplo, passar rapidamente os olhos pelas questões ou exercícios) (Medeiros et al., 2020; Silva et al., 2023; Tan & Pang, 2023).
Ademais, apesar de ser considerado um fenômeno multidimensional, estudos têm apontado que a dimensão cognitiva (normalmente referida como preocupação) é um componente que pode influenciar de maneira significativa o desempenho dos alunos (Medeiros et al., 2020; Silva et al., 2022). Essa dimensão se refere a processos cognitivos, relacionados a sentimentos de despreparo e preocupações com as consequências negativas de uma possível reprovação (Jerrim et al., 2023). Nesse ínterim, devido à amplitude e complexidade dos processos que compõem a dimensão preocupação, esse construto tem ganhado destaque na literatura, sendo também conhecido como ansiedade cognitiva de provas (ACP) (Stefan et al., 2020), que se refere a uma reação emocional e afetiva, a qual surge acompanhada por preocupações persistentes sobre o fracasso e suas consequências (Putwain et al., 2023).
A ACP é composta por reações cognitivas dos indivíduos a situações avaliativas e ao diálogo interno em relação a essas situações, tanto nos momentos anteriores como durante e após as provas, sendo essa uma das conexões mais fortemente relacionadas ao desempenho nas avaliações em estudantes do ensino superior (Gyasi & Bedu-Addo, 2023). Nesse sentido, entende-se que ACP é um evento multicausal que é influenciado por fatores, como a criação de autocrenças negativas, que podem influenciar na gravidade da ansiedade. Por exemplo, alunos com crenças de baixa competência antecipam o fracasso por influência de pensamentos catastróficos e negativos sobre o provável insucesso e suas consequências e acabam experimentando ansiedade em níveis elevados (Putwain & Aveyard, 2018).
A ACP ocasiona uma “interferência cognitiva”, resultando em dificuldades de concentração, problemas de memória e uma sensação de “dar branco” durante a prova (Putwain et al., 2023). Dessa forma, indivíduos com altos níveis de ACP tendem a ter um rendimento insatisfatório nas provas (devido a habilidades de codificação e armazenamento ruins) que compromete o desempenho ideal (Stricker et al., 2022). Além disso, os declínios no desempenho são atribuídos a uma junção de elementos, como a incapacidade de processar ou recuperar efetivamente as informações necessárias, além de ansiedade elevada provocada pela autopercepção de ausência de preparação ou de habilidade (Medeiros et al., 2020; Silva et al., 2022).
Esses processos cognitivos associados aos sintomas de ansiedade provocam uma mudança atencional para informações irrelevantes, dificultando o foco no que é pertinente para a tarefa, prejudicando, assim, o desempenho acadêmico (Möcklinghoff et al., 2023). Assim, para reduzir a sintomatologia ansiosa, o indivíduo opta por procrastinar atividades acadêmicas (Bolbolian et al., 2021). Nesses casos, a procrastinação pode ser entendida como uma resposta comportamental de evitação para ACP. Sendo assim, a PA não é apenas um deficit nos hábitos de estudo ou gerenciamento do tempo, mas uma interação complexa de componentes cognitivos, comportamentais e afetivos. Nesse sentido, mesmo apresentando resultados negativos, como decréscimos no desempenho acadêmico (Silva et al., 2020), a PA é considerada um comportamento difícil de se modificar, por proporcionar conforto temporário e alívio em curto prazo (Fortes & Barbosa, 2018).
Entretanto, apesar da ansiedade em situações avaliativas e da PA se mostrarem relevantes entre universitários, como demonstram pesquisas prévias, ressalta-se que estudos sobre a temática ainda são escassos no Brasil, carecendo de evidências empíricas (Couto et al., 2020; Medeiros et al., 2020; Silva et al., 2022), somadas à verificação da influência de outras variáveis na explicação do comportamento procrastinador. Nesse âmbito, tem-se observado que as características pessoais, como traços de personalidade ou variáveis demográficas, podem ajudar na explicação dessa conduta (Silva et al., 2020, 2022, 2023). Em relação aos antecedentes, verifica-se que variáveis demográficas, como idade e gênero, podem ajudar a explicar a conduta de PA. Estudos como o de Danne et al. (2024) sugerem uma diminuição da procrastinação ao longo da vida adulta, com grupos mais jovens exibindo níveis mais elevados, corroborando a pesquisa de Beutel et al. (2016).
Nesse sentido, os estudos têm investigado a PA entre estudantes universitários, destacando diferenças na prevalência e associações com idade e gênero. Assim, verifica-se que pessoas mais jovens apresentam uma maior tendência a procrastinar suas atividades acadêmicas (Danne et al., 2024; Umerenkova & Flores ., 2017). Entretanto, ressalta-se que ainda não existe um consenso em relação à variável idade. Por exemplo, outras evidências sugerem que a variável idade não é relevante para explicar a PA (Nazari et al., 2021), incluindo pesquisa realizada no âmbito brasileiro (Silva et al., 2020).
Ainda, referente às variáveis demográficas, os estudos apontam variações na PA de estudantes universitários. O estudo levado a cabo por Babu et al. (2019), em uma amostra de estudantes de Bengaluru, observou diferenças significativas em relação ao gênero. Resultados similares são encontrados na Malásia (Kassim et al., 2022) e Turquia (Balkis, & Duru, 2017; Mocan, 2022), sendo reforçados pela metanálise realizada por Lu et al. (2022), indicando que os homens tendem a procrastinar mais do que as mulheres em termos gerais e acadêmicos. Entretanto, as pesquisas supracitadas divergem de outros estudos (Ajayi, 2020; Amoke et al., 2021), incluindo em amostra de universitários do Nordeste brasileiro (Silva et al., 2020), que sugerem o gênero como um preditor não significativo do comportamento de PA.
Em suma, os resultados conflitantes e heterogêneos relatados na literatura impossibilitam que sejam tiradas conclusões fidedignas em relação às variáveis em questão. Dito isso, cabe salientar que os estudos realizados no Brasil, apesar de serem escassos, demonstram diferentes resultados, os quais sugerem que as variáveis demográficas idade e gênero não contribuem para a explicação da PA (Silva et al., 2020, 2023). Tais resultados demonstram a necessidade de serem realizados estudos adicionais para traçar um perfil mais adequado de universitários brasileiros que praticam PA.
Nesse sentido, as pesquisas sobre procrastinação revelam nuances em relação aos seus antecedentes e consequentes. Por exemplo, enquanto um estudo de Shimamura et al. (2022) constatou uma relação entre status socioeconômico e a PA, as descobertas de Lu et al. (2022) sugerem que o comportamento procrastinador pode não variar significativamente com base nesse aspecto. No entanto, outros fatores sociais e psicológicos desempenham um papel importante. Nesse ínterim, verifica-se que indivíduos com maior percepção de importância social e autoeficácia tendem a procrastinar menos (Yeoh et al., 2022). Além disso, destaca-se a influência do ambiente familiar, por meio da parentalidade autoritária, para o desenvolvimento da PA (Chen et al., 2022), demonstrando que a procrastinação é um fenômeno influenciado por aspectos sociais, psicológicos e ambientais (Silva et al., 2021).
Ademais, a literatura tem demonstrado que diferentes variáveis podem ajudar a explicar a PA, como traços de personalidade, especificamente o neuroticismo (Dominguez Lara et al., 2019). Outros preditores são o perfeccionismo desadaptativo (Krispenz et al., 2019), medo do fracasso (Danne et al., 2024), falta de motivação, estresse, uso excessivo da internet e dificuldade de realizar tarefas (He, 2017). Sabe-se também que os pensamentos automáticos, juntamente às autocrenças disfuncionais (Plado & Michels, 2021), além da ACP (Núñez-Balladares & Gavilanes-Gómez, 2023), podem atuar como aspectos cognitivos que explicam a PA.
Dito isso, compreende-se que quanto mais elevada a ACP, pior o desempenho nas provas (Medeiros et al., 2020). Além disso, como estratégia para reduzir os sintomas ansiosos, o indivíduo procrastina suas atividades (Bolbolian et al., 2021). Isso reforça a premissa de que as emoções negativas podem funcionar como fatores de risco para o comportamento procrastinador (Behnagh & Ferrari, 2022; Yang et al., 2021). Nesse enfoque, o presente estudo objetivou verificar em que medida a ACP explica a PA, controlando o efeito influência das variáveis sexo e idade, em universitários do Brasil. Especificamente, esta pesquisa foca na ACP como um dos fatores que podem explicar a PA, o qual, muitas vezes, está associado a níveis mais elevados de ansiedade de provas (Silva et al., 2023).
Método
Participantes
Contou-se com uma amostra não probabilística (por conveniência) de 570 universitários de diferentes estados do nordeste brasileiro (a partir da técnica bola de neve), que estavam devidamente matriculados e frequentando aulas em alguma instituição de ensino superior (Midade = 22,43; DP = 5,43; com idades variando de 18 a 56 anos). Esses eram em maioria mulheres (59,5%), de instituições públicas (59,8%), que cursavam Psicologia (41,8%) e Fisioterapia (11,1%). Os critérios de inclusão da pesquisa foram: ter no mínimo 18 anos, residir na região nordeste do Brasil e serem universitários. Os critérios de exclusão contemplaram pessoas que se encaixavam nos critérios de inclusão, mas se recusaram a participar da pesquisa.
Instrumentos
Escala de Ansiedade Cognitiva de Provas (EACP). Instrumento elaborado por Cassady e Johnson (2002), a escala foi adaptada para o Brasil por Medeiros et al. (2020). A EACP reúne 16 itens, os quais avaliam um fator geral da ACP (e.g., item 01., “A preocupação pelas avaliações me tira o sono” e Item 03, “Durante as avaliações eu penso muito nas consequências de uma reprovação”). Estes são respondidos em escala do tipo Likert, variando entre 1 (nada frequente em mim) e 4 (muito frequente em mim).
Os itens foram analisados pelo software AMOS, versão 26, e, por meio da Análise Fatorial Confirmatória (AFC, com estimador Weighted Least Square Mean and Variance Adjusted [WLSMV]), foi corroborada a estrutura unifatorial, que apresentou ajuste de modelo adequado: χ2/ gl = 4,76, CFI = 0,92; TLI = 0,93; RMSEA = 0,08 (IC90% = 0,07 - 0,09; p < 0,001). Na presente pesquisa, a EACP apresentou um coeficiente de consistência interna adequado (α de Cronbach = 0,94). A sua pontuação global varia de 16 (mínima) a 64 (máxima). Quanto maior a pontuação global do indivíduo, maior será o seu nível de ansiedade cognitiva em provas.
Escala de Procrastinação de Tuckman (EPT). Elaborada por Tuckman (1991), foi adaptada para o Brasil por Couto et al. (2020), que objetivam medir de forma global a tendência de perder tempo, procrastinar e deixar de fazer as coisas que se deveria fazer. É composta por 14 itens, como (e.g. item 2 Adio o início das coisas que não gosto de fazer), nas quais quatro (itens 05, 07, 10 e 13) são codificados inversamente (e.g. item 5. Começo a trabalhar imediatamente, mesmo em atividades que eu acho desagradável.). Estes são respondidas em escala de cinco pontos tipo Likert, variando de 1 (Nunca) a 5 (Sempre). Por meio da AFC e do estimador WLSMV, foi possível observar uma adequação da estrutura unidimensional da medida, que apresentou adequado ajuste de modelo: χ2/ gl = 4,80, CFI = 0,92; TLI = 0,95; RMSEA = 0,08 (IC90% = 0,07 - 0,10; p < 0,001). Apresenta consistência interna significativa de α de Cronbach = 0,79. A sua pontuação global varia de 14 (mínima) a 70 (máxima). Quanto maior a pontuação global do indivíduo, maior será o seu nível de procrastinação acadêmica.
Questionário Sociodemográfico. O questionário sociodemográfico foi composto por um grupo de perguntas que teve como principal objetivo caracterizar a amostra (e.g., sexo, idade, local de residência, tipo de instituição de ensino, curso etc).
Procedimentos
A coleta ocorreu em ambiente virtual e foi efetivada por meio da plataforma Google forms, no qual foi disponibilizado um link divulgado em diferentes plataformas digitais (e.g., Facebook, Telegram, Instagram, Twitter e WhatsApp). Para tanto, foi considerada a técnica de “bola de neve” no recrutamento de participantes. Para todos que aceitaram participar voluntariamente da pesquisa, foi esclarecido o propósito do estudo, além de assegurado o sigilo e anonimato das respostas, e que a participação na pesquisa não acarretaria ônus ou bônus direto, com a possibilidade de desistência a qualquer momento do estudo. Seguiram-se todos os procedimentos éticos de acordo com o que estabelecem as Resoluções 466/12 e 510/16 do CNS, sendo aprovado e autorizado por um Comitê de Ética e Pesquisa com seres humanos de uma instituição particular do nordeste brasileiro (CAAE: 60257122.9.0000.8133 Parecer: 5.577.736).
Análise de dados
Os dados foram tabulados e analisados por meio do pacote estatístico SPSS – versão 25. Foram realizadas análises descritivas com o intuito de caracterizar a amostra. Posteriormente, realizaram-se análises de correlação e regressão linear múltipla hierárquica, visando conhecer o poder preditivo da ansiedade cognitiva de provas controlando as variáveis (idade e sexo) na procrastinação acadêmica.
Resultados
Inicialmente, objetivou-se conhecer a relação entre a ACP e a PA. A princípio, destacam-se as médias e os desvios-padrões dos construtos em questão. Assim, ressalta-se que a média do constructo ACP (M = 2,68, DP = 0,75) teve valor acima da pontuação média da escala de resposta (2) e, por fim, foi observado que a pontuação da escala de PA (M = 3,11, DP = 0,62) também apresentou um valor acima da pontuação média da escala de resposta (2,5). Na sequência, foi realizada uma correlação de Pearson, a qual indicou uma relação positiva e significativa entre ACP e a PA (r = 0,37; p < 0,001). Portanto, quanto maior for o nível de ACP, maior tende a ser o nível de PA apresentado por esse público.
Posteriormente, visando complementar as análises acerca da relação entre as variáveis em questão, buscou-se verificar em que medida a ACP explicava a PA, controlando os efeitos das variáveis idade e sexo (1 = Masculino, 0 = Feminino). Nesse caso, realizou-se uma análise de regressão linear múltipla hierárquica, introduzindo como variável critério a PA; as variáveis demográficas idade e sexo entraram no primeiro bloco, enquanto a ACP foi introduzida no segundo bloco. Especificamente, as variáveis demográficas explicaram cerca de 5% da variância em PA [R = 0,23, R² ajustado = 0,05; F (2, 551) = 15,400, p < 0,001]; a inclusão da ACP elevou a explicação da PA para 18% [R = 0,43, R²ajustado = 0,18; F (3, 550) = 41,661, p < 0,001].
Por fim, no que diz respeito a cada variável em particular, entre as demográficas, a idade foi a única que contribuiu de forma significativa (β = -0,23, t = -5,524, p < 0,001), não sendo significativa a contribuição da variável sexo (β = -0,02 t = -0,573, p > 0,05). Em se tratando da ACP, quando controlado o efeito das variáveis demográficas, observa-se que essas variáveis em questão contribuem de maneira significativa para a explicação da PA (β = 0,37, t = 9,447, p < 0,001). Os resultados estão descritos na Tabela 1.
Tabela 1
Análise de Regressão Hierárquica dos Preditores da Procrastinação Acadêmica
Variáveis |
B |
DP |
β |
Modelo |
Passo 1 |
F (2,551) = 15,400* R²= 0,05 |
|||
Idade |
-0,03 |
0,11 |
-0,23* |
|
Sexoa |
-0,03 |
0,05 |
0,02 |
|
Passo 2 |
F (3;550) = 41,661* R²= 0,18 Δ R² = 0,13 |
|||
Idade |
-0,02 |
0,01 |
-0,19* |
|
Sexoa |
0,05 |
0,05 |
0,04 |
|
Ansiedade Cognitiva de Provas |
0,31 |
0,03 |
-0,37** |
Nota. p < 0,001*; DP = desvio-padrão; aMasculino = 1, Feminino = 0.
Discussão
O presente estudo teve por objetivo verificar em que medida a ACP explica a PA, controlando o efeito das variáveis sexo e idade, em universitários da região Nordeste do Brasil. Assim, reportando-se então a relação entre ACP e a PA, os resultados desta pesquisa fornecem evidências que corroboram que a variável demográfica idade e a ACP explicam o comportamento procrastinador dos estudantes universitários.
Inicialmente, buscou-se verificar se as variáveis demográficas (idade e sexo) eram preditoras da PA em universitários. Em relação à variável idade, os resultados a indicaram como um preditor significativo do comportamento procrastinador. Nessa perspectiva, os dados obtidos nesta pesquisa corroboram com as evidências que sugerem que pessoas mais jovens tendem a procrastinar mais do que pessoas mais velhas (Araoz et al., 2021; Formighieri et al., 2019; Khan et al., 2014; Liu et al., 2022; Steel, 2007). Entretanto, salienta-se que existe um debate acadêmico acerca dessa influência, cabendo destacar que ainda é inconclusiva a influência da idade na PA, pois existem evidências que sugerem que a faixa etária não é um preditor significativo da PA (Fuente et al., 2021). Isso é reforçado em pesquisa realizada por Silva et al. (2020) com universitários nordestinos, que também sugeriu que a faixa etária não era um preditor significativo da PA.
Quanto à relação entre indivíduos mais novos e PA, isso pode ser justificado pelo fato de que, tradicionalmente, muitos estudantes universitários iniciam a faculdade após concluir o ensino médio, sendo, de maneira geral, jovens (Pedrelli et al., 2015). Adicionalmente, além da adaptação à vida universitária, existe a transição para a vida adulta (Mclafferty et al., 2017). Ademais, estudantes mais velhos tendem a controlar mais seus impulsos e, no transcurso da graduação, costumam desenvolver melhores habilidades de estudo e administração do tempo, objetivando tirar boas notas nas avaliações (Araoz et al., 2021). Devido a tais evidências, sugere-se que pesquisas que elejam a PA como variável de desfecho continuem a explorar os efeitos da idade no comportamento procrastinador.
No que diz respeito à variável sexo dos participantes, não foram observados efeitos significativos na PA. Nesse domínio, sabe-se que, apesar de as pesquisas demostrarem que majoritariamente os homens apresentam níveis mais elevados de comportamentos de PA em comparação com as mulheres (Khan et al., 2014), outros estudos sugerem que as mulheres tendem a procrastinar mais suas atividades acadêmicas (Özer et al., 2009). Além disso, existem evidências que apontam que a variável sexo do participante não é um preditor da procrastinação em universitários (Bolbolian et al., 2021). Esse resultado se alinha com pesquisa anterior, também realizada em estados do Nordeste brasileiro, que revelou que a variável sexo não está associada de forma significativa com a PA de universitários (Silva et al., 2022). Adicionalmente, isso também é corroborado pela pesquisa realizada por Fentaw et al. (2022), com universitários da Etiópia, que identificou que a procrastinação acontece independentemente do gênero e do tipo de instituição (pública e particular).
Sobre os resultados inconsistentes relatados na literatura, Lu et al. (2022) apontam que podem ocorrer em razão da forma que o fenômeno está sendo avaliado, como, por exemplo, em consequência do instrumento de medida, em função dos níveis educacionais e outras características que podem funcionar como possíveis moderadores da associação entre gênero e procrastinação. Ademais, Santos Rego et al. (2020) argumentam que as mulheres obtêm maiores índices de sucesso acadêmicos, pois adotam estratégias de aprendizagem e hábitos de estudo eficazes. Esse é outro fator que pode influenciar na relação entre gênero e PA. Tais evidências reforçam a necessidade de serem realizadas pesquisas complementares, visando determinar se em contexto brasileiro a PA não é influenciada pela variável sexo dos universitários. Dito isso, é necessário explorar outras regiões e estados brasileiros, para identificar um perfil mais detalhado de estudantes que praticam de forma mais acentuada os comportamentos de procrastinação.
Por fim, também foi verificado que a ACP é um preditor significativo da PA. Assim, os resultados da presente pesquisa reforçam que níveis mais acentuados de ACP estão relacionados a índices mais elevados de PA, como já evidenciado em outras pesquisas (Njuguna et al., 2022; Okoye & Oghenekaro, 2020). Essa relação é reportada na literatura, que aponta a PA como um comportamento que é utilizado em resposta à ACP, devido às preocupações e aos desconfortos emocionais provocados pelas situações de avaliação (Bolbolian et al., 2021). No entanto, ressalta-se que a associação entre ACP e PA apresentou um valor modesto, indicando que outras variáveis podem impactar essa relação.
Dito isso, seria interessante considerar outras variáveis, como autoconceito estudantil, perfeccionismo e desempenho acadêmico. Por exemplo, sabe-se que a procrastinação está correlacionada negativamente com a autoavaliação dos estudantes sobre o seu desempenho acadêmico (Silva et al., 2020). Esse fator representa um modo de agir mais inseguro, preocupado e perfeccionista, o que possivelmente leva a uma postergação da tarefa até o momento em que não é mais possível adiá-la (Geara et al., 2017). Outrossim, os achados deste estudo reforçam a influência significativa dos fatores cognitivos na explicação da PA.
Considerações Finais
Dado o exposto, estima-se que os objetivos da pesquisa tenham sido alcançados. Entretanto, como em todo empreendimento científico, esse não está isento de limitações, sendo necessário apontá-las. Assim, cita-se inicialmente a amostra, que foi restrita a universitários da região Nordeste do Brasil, fato que limita a generalização dos resultados para outras populações e contextos geográficos e culturais (Silva et al., 2022). Entretanto, salienta-se que não foi objetivo da pesquisa generalizar resultados, mas verificar possíveis variáveis que explicassem o comportamento procrastinador em universitários.
Além disso, apenas as variáveis demográficas idade e sexo foram controladas na análise de regressão, sendo necessário explorar outras variáveis, que podem ser igualmente importantes, como nível socioeconômico e fatores sociais, a exemplo da escolaridade dos pais (Fuente et al., 2021). Outra limitação refere-se à distribuição amostral em relação ao sexo (homem e mulher), que não foi equitativa. Esse desequilíbrio não é incomum em pesquisas sobre a temática da procrastinação; fato que, apesar de não interferir nos resultados da presente pesquisa, aponta para a necessidade de serem realizadas pesquisas adicionais, para verificar possíveis associações, incluindo, por exemplo, identidades de gênero (Rahimi et al., 2023).
Por fim, outra limitação deste estudo refere-se ao caráter transversal da pesquisa, que impede que se determine causalidade (Silva et al., 2022). Nesse âmbito, sabe-se da importância de serem realizadas pesquisas com desenhos longitudinais e/ou experimentais. Isso favoreceria que fossem observadas conclusões sobre direção e causalidade das relações entre variáveis, que é de particular importância para elaboração de um modelo de mediação (Oflazian & Borders, 2023; Wang, 2021).
Nessa linha, verifica-se a necessidade de serem realizada pesquisas futuras, visando aprofundar as temáticas em questão em diferentes contextos e utilizando diferentes metodologias. Nesse sentido, Flett et al. (2016) sugerem que sejam explorados fatores cognitivos que representam riscos para o comportamento procrastinador, como pensamentos ruminativos e pensamentos automáticos, bem como fatores de proteção, como resiliência, atenção plena e autocompaixão. Além disso, é crucial incluir a regulação emocional, uma vez que as emoções desempenham um papel importante na capacidade de organização interna e externa, podendo contribuir para os mecanismos que relacionam a ACP e o comportamento procrastinador. Conhecer as possíveis relações entre PA e emoções dos universitários, especialmente, a ansiedade, pode possibilitar que sejam elaboradas intervenções mais eficazes, principalmente aquelas pautadas na regulação emocional (Behnagh & Ferrari, 2022; Silva et al., 2022).
Em suma, os resultados deste estudo confirmaram a existência de uma relação positiva e significativa entre a ACP e a PA em estudantes universitários da região nordeste do Brasil. Assim, demonstrou-se que a ACP desempenha um papel relevante na PA em estudantes universitários do Nordeste brasileiro. Notavelmente, a idade foi a única variável demográfica que contribuiu significativamente para a explicação da PA, sugerindo que estudantes mais jovens tendem a procrastinar com mais frequência nas atividades acadêmicas.
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Recebido em: 21/07/2023
Última revisão:12/02/2024
Aceite final: 11/03/2024
Sobre os autores:
Gleyde Raiane de Araújo: [Autora para contato]. Mestra em Psicologia pela Universidade Federal do Delta do Parnaíba (UFDPar). Psicóloga graduada pela Faculdade Piauiense (FAP).; Atualmente, é professora universitária na Faculdade Ieducare (FIED) e no Centro Universitário Inta (UNINTA), campus Tianguá. Integrante do Laboratório de Avaliação Psicológica e Psicometria do Piauí (LABAP). Coordenadora do Laboratório de Estudo e Pesquisa em Terapias Cognitivo-Comportamentais. E-mail: gleydearaujo@hotmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0680-1250
Gustavo Oliveira de Araujo: Graduado em Psicologia pela Faculdade Ieducare (FIED). E-mail: psigustavooliveiraa@gmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1396-1025
Paulo Gregório Nascimento da Silva: Doutor em Psicologia Social pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Mestre em Psicologia pela Universidade do Vale do São Francisco (UNIVASF). Graduado em Psicologia pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Atualmente, realiza estágio Pós-Doutoral em Psicologia na Universidade de Fortaleza (UNIFOR). E-mail: silvapgn@gmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0002-2878-309X
André Sousa Rocha: Mestre em Psicologia pela Universidade São Francisco (USF). Psicólogo pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Docente do curso de Psicologia do Centro Universitário UNINTA, Campus Itapipoca. E-mail: andresousarocha9@gmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0002-0185-9699
Jocélia Medeiros Ximenes: Mestra em Psicologia e Políticas Públicas pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Graduada em Psicologia pela UFC. Professora Universitária do Centro Universitário INTA (UNINTA), Sobral, CE. Atualmente, é coordenadora da Liga Acadêmica sobre Neurociência e Comportamento (LANeC). E-mail: jocelia.ximenes@uninta.edu.br, ORCID: https://orcid.org/0000-0001-9850-4423
Laís Renata Lopes da Cunha: Graduanda no curso de Psicologia da Universidade Federal do Delta do Parnaíba (UFDPar). Atualmente, é bolsista do Programa de Iniciação Cientifica da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Piauí (FAPEPI). Integrante do Laboratório de Avaliação Psicológica e Psicometria do Piauí (LABAP). E-mail: laisrenatafju@gmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0003-0832-2680
Paloma Cavalcante Bezerra de Medeiros: Doutora em Psicologia Social pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Professora adjunta II do Departamento de Psicologia e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia (Mestrado), na UFDPar, Parnaíba, Piauí, Brasil. Coordenadora do Laboratório de Neurociência e Psicologia Social (LaNPSo) e do Núcleo de Neurociência Social Pesquisa Intervenção Cognitivo Comportamental (NNeSPICC). E-mail: palomacbmedeiros@gmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5868-8333
Emerson Diógenes de Medeiros: Doutor em Psicologia Social pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Professor associado III do curso de Graduação e Pós-Graduação em Psicologia (Mestrado) da Universidade Federal do Delta do Parnaíba (UFDPar). Líder do Laboratório de Avaliação Psicológica e Psicometria do Piauí (LABAP). E-mail: emersondiogenes@gmail.com, ORCID: https://orcid.org/0000-0002-1407-3433
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