Relações Entre Comportamento Materno, Depressão Pós-Parto e o Desenvolvimento de Bebês Pré-Termo aos Três Meses de Vida
Relations Between Maternal Behavior, Postpartum Depression, and the Development of Preterm Infants at Three Months of Age
Relaciones Entre el Comportamiento Materno, la Depresión Posparto y el Desarrollo de Bebés Prematuros a los Tres Meses de Vida
Mariana Cristina Simioni
Tainá Guedes Silva
Taís Chiodelli
Olga Maria Piazentin Rolim Rodrigues
Universidade Estadual Paulista (Unesp)
Resumo
A interação mãe-bebê pode ser influenciada por fatores como prematuridade e saúde mental materna. Este estudo descreveu e correlacionou o desenvolvimento de bebês pré-termo aos três meses de vida, os comportamentos interativos maternos e os indicadores de depressão pós-parto. Participaram 23 díades mães-bebês. A interação foi observada de forma livre e codificada pelo Interadíade. As mães responderam à Escala de Depressão Pós-Parto de Edimburgo e o desenvolvimento infantil foi avaliado pela Escala Bayley de Desenvolvimento Infantil. Os dados foram analisados com estatística descritiva e inferencial. Os bebês apresentaram desempenho dentro do esperado em desenvolvimento motor fino e linguagem expressiva, mas abaixo da média em cognição, linguagem receptiva e desenvolvimento motor grosso. As mães passaram mais tempo brincando, observando, apresentando objetos, atraindo a atenção e esperando pela resposta dos bebês. Indicadores clínicos de depressão pós-parto foram identificados em 43,5% da amostra. O comportamento materno de esperar se correlacionou com linguagem receptiva, cognição e desenvolvimento motor fino, sendo o mais relacionado ao desenvolvimento dos bebês. Não foram observadas correlações entre depressão pós-parto e as variáveis investigadas. Os resultados destacam a importância da promoção de comportamentos maternos responsivos, como esperar pela resposta do bebê, como forma de apoiar o desenvolvimento de bebês pré-termo.
Palavras-chave: recém-nascido, prematuro, depressão pós-parto, relações mãe-filho
Abstract
Mother-infant interaction can be influenced by factors such as prematurity and maternal mental health. This study described and correlated the development of preterm infants at three months of age, maternal behaviors in interaction with their infants and indicators of maternal postpartum depression. Twenty-three mother-infant dyads participated. The interaction was freely observed and coded using the Interadíade protocol. Mothers completed the Edinburgh Postnatal Depression Scale, and infant development was assessed using the Bayley Scales of Infant and Toddler Development. Data were analyzed using descriptive and inferential statistics. Infants showed performance within the expected range in fine motor development and expressive language, but below average in cognition, receptive language, and gross motor development. Mothers spent more time playing, observing, presenting objects, attracting their infants’ attention, and waiting for their responses. Clinical indicators of postpartum depression were identified in 43.5% of the sample. The maternal behavior of waiting was correlated with the receptive language, cognition, and fine motor development, being the one most related to infant development. No correlations were observed between postpartum depression and the investigated variables. The findings highlight the importance of promoting responsive maternal behaviors, such as waiting for the infant’s response, as a means to support the development of preterm infants.
Keywords: newborn, premature, depression postpartum, mother-child relations
Resumen
La interacción madre-bebé puede verse influenciada por factores como la prematurez y la salud mental materna. Este estudio describió y correlacionó el desarrollo de bebés prematuros a los tres meses de vida, los comportamientos interactivos maternos y los indicadores de depresión posparto. Participaron 23 díadas madre-bebé. La interacción fue observada de forma libre y codificada mediante el protocolo Interadíade. Las madres respondieron a la Escala de Depresión Posparto de Edimburgo y el desarrollo infantil fue evaluado mediante la Escala Bayley de Desarrollo Infantil. Los datos fueron analizados con estadística descriptiva e inferencial. Los bebés presentaron un desempeño dentro de lo esperado en desarrollo motor fino y lenguaje expresivo, pero por debajo del promedio en cognición, lenguaje receptivo y desarrollo motor grueso. Las madres pasaron más tiempo jugando, observando, presentando objetos, atrayendo la atención y esperando la respuesta de sus bebés. Indicadores clínicos de depresión posparto fueron identificados en el 43,5% de la muestra. El comportamiento materno de esperar se correlacionó con el lenguaje receptivo, la cognición y el desarrollo motor fino, siendo el más relacionado con el desarrollo de los bebés. No se observaron correlaciones entre la depresión posparto y las variables investigadas. Los resultados destacan la importancia de promover comportamientos maternos responsivos, como esperar la respuesta del bebé, para apoyar el desarrollo de los bebés prematuros.
Palabras-clave: recién nacido, prematuro, depresión posparto, relaciones madre-hijo
Introdução
Nos primeiros anos de vida, a interação mãe-bebê é de fundamental importância, uma vez que a relação estabelecida entre a díade exerce um impacto significativo no desenvolvimento infantil (Lisboa & Fernandes, 2021). Essa interação é bidirecional e multideterminada, podendo ser influenciada por fatores filogenéticos, história de vida, saúde mental materna e fatores culturais. Rocha et al. (2019) apontaram variáveis que medeiam a relação entre a interação mãe-bebê e o desenvolvimento infantil, entre elas a prematuridade do bebê.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (Word Health Organization [WHO], 2023), o nascimento pré-termo é aquele com menos de 37 semanas de gestação, e quanto menor a idade gestacional, maior é o risco para o desenvolvimento do bebê. O Brasil está entre os 10 países com maiores índices de nascimentos pré-termo, ocorrendo cerca de 279.300 casos por ano (WHO, 2023). O nascimento pré-termo pode ser um fator de risco para o desenvolvimento cognitivo (Oliveira et.al, 2024, Schiavo et al., 2020), motor (Cuesta-Gómez et al., 2024, Schiavo et al., 2020) e de linguagem dos bebês (Hass et al., 2022, Schiavo et al., 2020). Esses efeitos são frequentemente potencializados por condições socioeconômicas adversas, principalmente em mães primíparas (Emmanuel et al., 2022). Além disso, o nascimento pré-termo pode gerar insegurança em relação à saúde física do bebê, resultando em receio parental em receber alta hospitalar e não ter a assistência de profissionais da saúde para o cuidado com a criança (Medeiros et al., 2020).
O monitoramento do desenvolvimento de bebês pré-termo pode ser caracterizado como uma ação de intervenção precoce, e para subsidiá-la, é importante a utilização de instrumentos padronizados e validados. Cruz et al. (2022), em uma revisão sistemática da literatura, destacaram a eficácia da utilização de escalas, como a Escala Bayley de Desenvolvimento Infantil-III (BSID-III), para avaliar o desenvolvimento infantil em crianças pré-termo de forma longitudinal, seja nos domínios neuropsicomotores, seja realizando uma avaliação global. Esse instrumento tem como objetivo avaliar o desenvolvimento de crianças de 16 dias a 42 meses e 15 dias. É composto por 326 tarefas, as quais são subdivididas nas seguintes áreas: cognição; linguagem expressiva e linguagem receptiva; motricidade fina e motricidade grossa; e comportamento adaptativo e desenvolvimento socioemocional. Os autores destacaram que o uso das BSID-III pode fornecer dados consistentes sobre as características desenvolvimentais desses bebês, o que possibilita o planejamento de intervenções que contemplem suas necessidades.
No estudo de Oliveira et al. (2024), a BSID-III foi utilizada para avaliar o desenvolvimento cognitivo de bebês pré-termo e a termo aos 6 e 12 meses de vida. A pesquisa foi realizada com crianças nascidas entre 2013 e 2015 na maternidade do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (HC-UFMG), sendo todas residentes na região metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil, e oriundas de famílias com nível socioeconômico baixo atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Os bebês pré-termo foram acompanhados por um programa de atendimento a crianças de alto risco do HC-UFMG. Os resultados indicaram que o desenvolvimento cognitivo dos bebês pré-termo foi inferior ao dos bebês a termo nas duas avaliações realizadas. Apesar disso, as comparações intragrupo mostraram que os bebês pré-termo apresentaram ganhos significativos nos escores cognitivos ao longo do tempo, sugerindo um potencial de recuperação, especialmente quando inseridos em contextos de acompanhamento especializado.
Associada à prematuridade, diferentes condições ambientais e biológicas podem influenciar a probabilidade de atrasos no desenvolvimento infantil, como as socioeconômicas da família e a saúde mental materna. Emmanuel et al. (2022) destacaram que mães de bebês pré-termo extremos (idade gestacional inferior a 28 semanas), residentes nos Estados Unidos e participantes de um projeto longitudinal, identificaram seus filhos como altamente dependentes delas. Nos casos em que as mães informaram que tinham pouco ou nenhum apoio, essa dependência resultou em uma exaustão materna e no agravamento de problemas de saúde.
Schiavo et al. (2020) compararam variáveis socioeconômicas e o desenvolvimento infantil em uma amostra brasileira, da cidade de Bauru, São Paulo, composta por 275 díades mães-bebês aos três meses de idade, sendo 168 bebês pré-termo e 107 a termo. As mães de bebês pré-termo apresentaram menor escolaridade, eram multíparas e tiveram gestações não planejadas, em comparação às mães de bebês a termo. Quanto ao desenvolvimento dos bebês pré-termo, avaliado pela BSID-III, nascer com baixo peso, ser do sexo masculino e ter irmãos aumentaram, respectivamente, as chances de atraso em cognição e no desenvolvimento motor fino.
Pereira et al. (2019), em um estudo com mães paranaenses cujos bebês pré-termo eram acompanhados em ambulatório de seguimento pós-alta, pontuaram que, em situações nas quais o nascimento é inesperado e repentino, tal qual ocorre em partos pré-termos, é comum que a família apresente, com maior frequência, sentimentos como ansiedade e medo. Assim, a prematuridade infantil é um dos fatores externos à relação mãe-bebê, mas que está diretamente relacionada à ansiedade e à saúde emocional materna, podendo relacionar-se à forma como a mãe responderá ao seu bebê.
Buesa et al. (2024), em um estudo com mulheres espanholas que tiveram parto pré-termo, identificaram que a tendência ao parto pré-termo já é suficiente para elas apresentarem pontuações mais altas em sintomas depressivos, assim como maior probabilidade de depressão pós-parto, quando comparadas ao grupo de mães que tiveram parto a termo. Em consonância a isso, o estudo de Pisoni et al. (2019), na Itália, revelou que cerca de três quartos da amostra de mães do seu estudo tiveram maiores sintomas depressivos pós-partos em gestações pré-termo do que em gestações a termo.
A depressão pós-parto (DPP) é caracterizada como um quadro de depressão maior que se inicia no periparto, ou seja, durante a gestação ou nas primeiras quatro semanas após o parto (Associação Americana de Psiquiatria [APA], 2023). Santana et al. (2022) realizaram uma revisão integrativa da literatura para identificar a prevalência e os fatores de risco associados à DPP no Brasil. Os resultados variaram de acordo com a região do país, com prevalência entre 7,2% no Recife, Pernambuco, e 39,4% em Vitória, Espírito Santo. Foram encontrados 20 fatores de risco, como a história prévia materna de transtornos psiquiátricos, escolaridade da mãe, renda familiar, cor da pele, gravidez não planejada e multiparidade.
A revisão sistemática da literatura e meta-análise realizada por Eduardo et al. (2019) incluiu 26 estudos e apontou que, embora a maioria deles (n = 18) tenha identificado relações entre o nascimento pré-termo e a DPP, muitas pesquisas ignoraram variáveis que interferem na ocorrência da DPP, como o histórico prévio materno de depressão. Além disso, oito estudos não encontraram tal associação. Os autores destacaram a heterogeneidade metodológica entre os estudos, especialmente quanto aos diferentes instrumentos utilizados para a avaliação da DPP, o que pode ter impactado os resultados. Observou-se, ainda, que os estudos incluídos provinham de 18 países, predominantemente da Europa (n = 14), não havendo nenhum estudo realizado na América do Sul ou na África. Dos 26 estudos, 12 foram incluídos na meta-análise, que indicaram um maior risco de DPP em mães de bebês pré-termo, particularmente em avaliações realizadas até 24 semanas após o parto, quando comparadas a mães de bebês nascidos a termo. Os autores ressaltaram que a prematuridade pode produzir efeitos tanto para a criança quanto para a mãe, recomendando que a DPP seja avaliada em mães de bebês pré-termo, especialmente no período pós-parto de 15 a 90 dias.
No estudo de Mavrogiorgou et al. (2022) com 25 díades mães-bebês alemãs e cujas mães apresentavam depressão pós-parto, foi verificado que elas apresentaram mais comportamentos passivos e menos trocas afetivas positivas na interação com seus filhos. De acordo com Weiss et al. (2023), características individuais das díades podem moderar a associação entre a DPP e a qualidade da interação mãe-bebê. Em seu estudo, nos Estados Unidos, a intensidade dos sintomas depressivos maternos se relacionou de forma mais significativa com a interação mãe-bebê quando as crianças eram do sexo masculino, apresentavam temperamento com altos níveis de afetividade negativa e tinham maior idade gestacional (nascimento a termo). Segundo Cunha et al. (2022), aspectos emocionais maternos como ansiedade, estresse e DPP podem se constituir como um fator de risco tanto para o vínculo mãe-bebê quanto para o desenvolvimento da criança, uma vez que pode levar a uma baixa responsividade materna, aumentando as chances da emissão de comportamentos intrusivos, hostis e retraídos na relação com o filho.
Comportamentos responsivos se referem às respostas maternas contingentes e adequadas aos sinais da criança (Isabella, Belsky & von Eye, 1989). Rocha et al. (2019), em uma revisão sistemática da literatura, apontaram que comportamentos maternos responsivos, como compartilhar atenção, afeto e aguardar as respostas da criança na interação, influenciaram o seu desenvolvimento social, cognitivo e de linguagem no decorrer do seu primeiro ano de vida. Em contrapartida, mães menos responsivas e que tinham uma probabilidade maior de emitir mais comportamentos intrusivos propiciaram um ambiente menos estimulador e limitante ao desenvolvimento infantil (Rocha et al., 2019).
Akkus et al. (2020), em um estudo com 70 díades mães-bebês com 18 meses residentes na Turquia, investigaram a responsividade materna, considerando a prematuridade e a depressão. A responsividade foi menor para as mães de bebês pré-termo em comparação às mães de bebês a termo. Além disso, sintomas depressivos maternos previram negativamente os escores de responsividade. O nível socioeconômico e a idade gestacional do bebê foram os preditores mais fortes para a responsividade materna.
Perante o exposto, evidencia-se que a prematuridade tende a acarretar impactos significativos no desenvolvimento infantil, na interação mãe-bebê e na saúde emocional materna. Observa-se uma lacuna na produção científica brasileira, principalmente no que se refere a estudos que avaliam de forma integrada esses aspectos, com foco nos primeiros meses de vida, o que reforça a importância de investigações que contemplem simultaneamente essas variáveis. Tais pesquisas podem subsidiar programas de intervenção mais adequados, favorecendo tanto o desenvolvimento dos bebês pré-termos quanto a saúde emocional materna. Além disso, destaca-se que a avaliação precoce da DPP contribui para o desenvolvimento de ações preventivas e intervenções que promovam o acolhimento, o tratamento e o acompanhamento adequado dessas mulheres.
O presente estudo, realizado com díades mães-bebês residentes em Bauru, São Paulo, tem como objetivos descrever e correlacionar o desenvolvimento de bebês nascidos pré-termo aos três meses de vida, os comportamentos maternos em interação com seus bebês e os indicadores de DPP materna.
Método
Participantes
Participaram do estudo 23 díades mães-bebês nascidos pré-termo. Trata-se de uma amostra de conveniência, composta por seis díades que participavam do projeto de extensão “Acompanhamento do desenvolvimento de bebês: avaliação e orientação aos pais”, oferecido pela Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Bauru, que acompanhava o desenvolvimento dos bebês no decorrer do primeiro ano de vida. Dezessete díades frequentavam um serviço de intervenção precoce direcionado a bebês nascidos pré-termo e oferecido pela SORRI-BAURU, um Centro Especializado em Reabilitação (CER/SUS). Todos os participantes eram residentes na cidade de Bauru, localizada no interior do estado de São Paulo. Consideraram-se como critérios de inclusão o nascimento pré-termo, ou seja, com idade gestacional inferior a 37 semanas, e mães alfabetizadas, a fim de possibilitar a aplicação do instrumento que avaliou os indicadores de depressão pós-parto. Bebês nascidos a termo e suas mães foram excluídos da pesquisa.
Os bebês tinham, em média, três meses e cinco dias (Desvio Padrão = 0,4; Mínimo = 2 meses e 20 dias; Máximo = 3 meses e 28 dias), nasceram com idade gestacional média de 34 semanas (Desvio Padrão = 1,9; Mínimo = 28 semanas; Máximo = 36 semanas) e peso médio de 2.275 gramas (Desvio Padrão = 519,9; Mínimo = 1100 gramas; Máximo = 3365 gramas). Ainda, 62,2% eram do sexo masculino e 65,2% permaneceram internados após o nascimento, com média de 8,1 dias de internação (Desvio Padrão = 16,4; Mínimo = 2 dias; Máximo = 75 dias).
Com relação às mães, a idade média foi de 28,3 anos (Desvio Padrão = 6,0; Mínimo = 19; Máximo = 41), 43,5% tinham ensino médio completo, 30,4% tinham ensino fundamental completo, 17,4% ensino superior completo e 8,7% tinham ensino fundamental incompleto. Atividade remunerada era exercida por 60,9% das mães. A gestação não foi planejada para 52,2% das mães e 56,5% eram multíparas (Média = 1,6; Desvio Padrão = 0,8; Mínimo = 1 filho; Máximo = 4 filhos). A cesárea foi a via de parto mais frequente para 73,9% das participantes. Quanto à configuração familiar, 91,3% das mães residiam com seu(s) filho(s) e companheiro. As demais configurações familiares apresentadas pelas díades foram uma mãe residindo com seu(s) filho(s) e uma mãe residindo com seu(s) filho(s), companheiro e avós do bebê. Com relação ao nível socioeconômico das famílias, 39,1% eram da classe B (B1 ou B2), 34,8% da classe C (C1 ou C2), 8,7% da classe D-E e 4,4% da classe A.
Instrumentos
Dados sociodemográficos. Os dados sociodemográficos das famílias foram coletados a partir de uma entrevista semiestruturada, com informações a respeito da família, gestação, parto e pós-parto, bem como condição de saúde do bebê.
Critério de Classificação Econômica Brasil (Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa [ABEP], 2018). As mães responderam a esse instrumento para a identificação do nível socioeconômico das famílias. O Critério Brasil classifica o domicílio em que a pessoa reside conforme o seu poder de compra, sendo composto por itens objetivos que a pessoa responde sobre quais ela possui em sua moradia, e se tem acesso a recursos básicos, como água e rua pavimentada, além da escolaridade do maior provedor.
Para a avaliação da depressão pós-parto, foi utilizada a Escala de Depressão Pós-Parto de Edimburgo (EPDS), validada para a população brasileira por Santos et al. (1999). Trata-se de um instrumento de rastreio e autorregistro composto por 10 questões relativas aos sintomas comuns de depressão (por exemplo: “eu tenho me sentido culpada sem necessidade quando as coisas saem erradas”, “eu tenho me sentido tão infeliz que tenho dificuldade de dormir” e “a ideia de fazer mal a mim mesma passou pela minha cabeça”) e a mãe responde em relação a como se sentiu nos últimos sete dias. Os itens são pontuados em escala Likert (zero a três pontos). A pontuação da escala varia entre 0 a 30, e a presença de 12 ou mais pontos é considerada como sintomatologia depressiva (Santos et al., 1999). O valor do Alfa de Cronbach foi de 0,87 (Malloy-Diniz et al., 2010).
Protocolo para codificação de comportamentos interativos maternos/paternos e do bebê – Interadíade (Rodrigues et al., 2020). Utilizado para codificar os comportamentos maternos durante interação com seu bebê, classificando-os em positivos e negativos. Os positivos são aqueles que podem atuar como promotores da interação com a criança: apresentar brinquedo, cuidar, observar, atrair a atenção para objetos ou para si, acalmar, esperar que ela responda, brincar sem objetos e acariciar. Os negativos incluem os comportamentos parentais que apresentam uma função de intrusividade na interação com a criança, ou produzem estimulação aversiva para ela, como cuidar excessivamente, verbalizar negativamente para ela, interromper a sua atividade sem motivo aparente ou completar a atividade por ela, estimular excessivamente e contato intrusivo.
Escala Bayley de Desenvolvimento Infantil 3ª Edição (BSID-III) (Bayley, 2006). Usada para avaliar o desenvolvimento dos bebês, a BSID-III é um instrumento composto por três subescalas – cognitiva, de linguagem (comunicação receptiva e expressiva) e motora (desenvolvimento motor fino e grosso) –, que avaliam o desenvolvimento de crianças pequenas na faixa etária de 1 a 42 meses de idade. A BSID-III é aplicada individualmente, com duração entre 30 a 60 minutos (Bayley, 2006). Ao término da aplicação, obtêm-se a pontuação (escore bruto) a partir da soma dos itens que foram aplicados e que a criança apresentou desempenho satisfatório, segundo os critérios estabelecidos pela escala. O escore bruto é transformado em escore ponderado, possibilitando a comparação do seu desenvolvimento com um escore normativo.
A BSID-III foi traduzida para o Brasil em 2018, mas os dados normativos se referem à amostra americana. O desempenho das crianças pode ser classificado a partir do escore ponderado em: abaixo da média (7 pontos ou menos), dentro da média (8 a 12 pontos) ou acima da média (13 pontos ou mais) (Bayley, 2006). O Alfa Cronbach para a população brasileira foi de 0,90 no estudo de Madaschi et al. (2016). A BSID-III também é composta pela Escala Socioemocional e pelo Questionário de Comportamento Adaptativo, ambos respondidos pelos pais. No presente estudo, foram usadas apenas as escalas administradas com a criança.
Procedimento de Coleta dos Dados
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética da Faculdade de Ciências da Unesp, campus de Bauru (CAAE: 649201817.9.0000.5398). As mães foram convidadas a participar da pesquisa no primeiro atendimento dos bebês nas instituições às quais estavam vinculados. Na ocasião, foram esclarecidas dúvidas sobre a pesquisa, responderam ao Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, à entrevista inicial e à EPDS. Em seguida, e após estabelecer vínculo com o bebê, seu desenvolvimento era avaliado pela BSID-III.
Na semana seguinte ao primeiro atendimento, a mãe era convidada a realizar a observação da interação com seu bebê. Além disso, recebia uma devolutiva dos instrumentos de saúde emocional e das avaliações do bebê e orientações pautadas nas necessidades da família. As mães que apresentavam indicadores de DPP eram acolhidas e encaminhadas para o serviço de Psicologia das instituições de saúde disponíveis na cidade.
Com relação à observação da interação mãe-bebê, foram registrados cinco minutos de interação em contexto livre. A mãe era instruída a interagir com o seu(sua) filho(a) durante cinco minutos, conforme estava habituada a fazer em outros contextos. Foi utilizada uma câmera digital para a gravação, um cronômetro para marcar o tempo de interação e brinquedos infantis, sendo o uso a critério de cada participante. A observação ocorreu em salas de atendimento individuais de cada instituição.
Procedimento de Análise dos Dados
As informações sociodemográficas dos participantes, os dados de desenvolvimento obtidos pelas BSID-III, os comportamentos maternos e as respostas das mães à EPDS foram tabulados em planilhas do Excel e analisados por estatística descritiva.
Para a análise da interação livre, os cinco minutos foram divididos em 300 intervalos de um segundo e foi analisada a duração dos comportamentos maternos segundo a segundo, seguindo as recomendações do Interadíade. A análise de fidedignidade das observações foi realizada para 40% da amostra (n = 9) e considerou os registros de dois observadores, um independente aos objetivos do estudo. A fidedignidade foi calculada pelo coeficiente de correlação intraclasse para cada comportamento analisado pelo Interadíade. Os coeficientes variaram entre 0,600 a 0,996 e foram considerados favoráveis com base nos critérios definidos por Cicchetti (1994).
As respostas maternas à EPDS foram obtidas somando os valores de referência descritos nas instruções para avaliação e interpretação. O ponto de corte de 12 ou mais foi considerado como indicador da presença de DPP (Santos et al., 1999). Os dados de desenvolvimento infantil foram corrigidos de acordo com o manual da BSID-III. Para as análises descritivas, considerou-se o escore ponderado. Na análise de correlação, foi usado o escore bruto.
Para a análise de correlação, utilizou-se o teste de Spearman conduzido pelo software IBM SPSS versão 27. O nível de significância considerado foi de 0,05. A força das correlações foi considerada a partir de Pestana e Gageiro (2014).
Resultados
Na Tabela 1, encontram-se apresentados os resultados obtidos pelos bebês na avaliação realizada pela BSID-III. Cognição foi a área em que o desempenho foi mais baixo, seguida pelas áreas de desenvolvimento motor grosso e linguagem receptiva. Com relação à classificação do desempenho, 73,9% dos bebês tiveram um desempenho abaixo da média em cognição, 65,2% em linguagem receptiva e 69,6% em desenvolvimento motor grosso. Por outro lado, 60,9% e 65,2% apresentaram desempenho dentro da média em linguagem expressiva e desenvolvimento motor fino, respectivamente.
Tabela 1
Desenvolvimento dos Bebês Avaliado pela BSDI-III Considerando Dados Descritivos e a Classificação do Desempenho
|
|
Cognição |
Ling. receptiva |
Ling. expressiva |
Motor fino |
Motor grosso |
|
|
Desempenho descritivo de acordo com pontuação ponderada |
Média (DP) |
5,7(3,7) |
6,9 (2,9) |
8,3(3,5) |
10,7(1,2) |
6,8(2,3) |
|
Mínimo |
1,0 |
3,0 |
2,0 |
9,0 |
2,0 |
|
|
Máximo |
14,0 |
14,0 |
14,0 |
12,0 |
12,0 |
|
|
|
n(%) |
n(%) |
n(%) |
n(%) |
n(%) |
|
|
Classificação de acordo com pontuação ponderada |
Abaixo da média |
17(73,9) |
15(65,2) |
7(30,4) |
7(30,4) |
16(69,6) |
|
Dentro da média |
5(21,7) |
7(30,4) |
14(60,9) |
15(65,2) |
7(30,4) |
|
|
Acima da média |
1(4,4) |
1(4,4) |
2(8,7) |
1(4,4) |
0(0,0) |
|
Notas. DP = Desvio Padrão; Ling. = linguagem.
Quanto aos comportamentos interativos maternos, conforme apresentado na Tabela 2, observa-se que as mães emitiram por mais tempo os comportamentos de brincar, observar o bebê, apresentar objetos, atrair a sua atenção para objetos ou para si, esperar as respostas dele e acariciar. Entre os comportamentos negativos, estimular em excesso foi o comportamento que teve maior duração.
Tabela 2
Descrição dos Comportamentos Maternos Apresentados Durante Interação com seus Bebês e dos Dados de Rastreio da Depressão Pós-Parto
|
Variáveis maternas |
Média |
DP |
Mínimo |
Máximo |
|---|---|---|---|---|
|
Apresentar objeto |
41,0 |
39,9 |
0,0 |
125,0 |
|
Cuidar |
11,1 |
10,7 |
0,0 |
43,0 |
|
Observa o bebê |
44,4 |
47,6 |
2,0 |
174,0 |
|
Atrair atenção |
25,3 |
27,9 |
0,0 |
97,0 |
|
Acalmar |
10,4 |
19,7 |
0,0 |
81,0 |
|
Acariciar |
22,4 |
22,7 |
0,0 |
105,0 |
|
Brincar |
81,3 |
36,7 |
6,0 |
148,0 |
|
Esperar |
24,9 |
25,8 |
0,0 |
98,0 |
|
Cuidar em excesso |
3,2 |
7,9 |
0,0 |
34,0 |
|
Verbalizar negativamente |
4,3 |
6,8 |
0,0 |
23,0 |
|
Interromper o bebê |
6,6 |
13,9 |
0,0 |
58,0 |
|
Estimular em excesso |
14,3 |
25,7 |
0,0 |
92,0 |
|
Contato intrusivo |
1,4 |
3,6 |
0,0 |
14,0 |
|
EPDS |
9,4 |
6,6 |
0,0 |
23,0 |
Notas. EPDS = Escala pós-parto de Edimburgo; Ling. = Linguagem; Desenv. = Desenvolvimento.
As mães também responderam à EPDS. A média de pontuação obtida pelas mães foi 9,4 (6,6) (Tabela 2). Essa pontuação não foi considerada clínica. Todavia, ao considerar o ponto de corte 12, 43,5% das mães apresentaram indicadores clínicos de depressão pós-parto.
Quanto às correlações, uma correlação negativa foi encontrada entre atrair a atenção do bebê para objetos ou para si e o desempenho do bebê em linguagem expressiva (rho = -,582; p = 0,004). Ou seja, quanto mais tempo a mãe passou atraindo a atenção do bebê, menos tempo ele passou emitindo vocalizações e demais comportamentos contemplados por esta área e vice-versa. A força desta correlação foi moderada. O comportamento materno de estimular o bebê em excesso também se correlacionou negativamente com o desempenho do bebê em linguagem (rho = -,534; p = 0,009). A força desta correlação também foi moderada.
O comportamento materno de brincar com o bebê apresentou uma correlação moderada com o seu desempenho em linguagem receptiva (rho = ,498; p = 0,016), indicando que quanto mais a mãe brincou com ele, melhor o seu desempenho em linguagem receptiva e vice-versa. O comportamento materno de esperar pelas respostas do bebê foi o que apresentou mais correlações positivas e moderadas com o desenvolvimento infantil, correlacionando-se com cognição (rho = ,426 p = 0,043), linguagem receptiva (rho = ,422; p = 0,045) e motricidade fina (rho = ,473; p = 0,023). Não foram encontradas correlações entre a pontuação materna obtida na EPDS com o desenvolvimento dos bebês e com os comportamentos interativos maternos.
Discussão
Este estudo descreveu e correlacionou o desenvolvimento de bebês pré-termo aos três meses de vida, os comportamentos maternos em interação com eles e os indicadores de DPP materna. Quanto ao desenvolvimento dos bebês, seu desempenho apresentou melhores pontuações nas áreas de desenvolvimento motor fino e linguagem expressiva, com maior número deles apresentando desempenho dentro da média esperada para a idade. Mais de 50% dos bebês tiveram desempenho abaixo da média em cognição, desenvolvimento motor grosso e linguagem receptiva. Todavia, também foi observada uma e/ou duas crianças que apresentaram desempenho acima do esperado. Esses resultados vão ao encontro da literatura, que aponta que crianças pré-termo apresentam defasagens em diversas áreas do desenvolvimento (Oliveira et al., 2024, Cuesta-Gómez et al., 2024, Schiavo et al., 2020).
O atraso no desenvolvimento de crianças nascidas pré-termo pode estar associado a dificuldades precoces prolongadas, órgãos imaturos e necessidade de tratamento em unidades de cuidados intensivos, o que pode acarretar em níveis de estresse e na falta de contato social com a família (Medeiros et al., 2020). O acompanhamento desses bebês e de sua família, durante a hospitalização e após a alta hospitalar, mostram-se essenciais para a identificação de atraso e a inserção da criança em serviços de intervenção o mais cedo possível. Em uma metanálise conduzida por Ferreira et al. (2020), a intervenção precoce com foco na família de crianças pré-termo apresentou efeito positivo sobre a cognição e o desenvolvimento motor dessas crianças. Zhang et al. (2021) também investigaram os efeitos de programas de intervenção precoce para este público, por meio de revisão sistemática da literatura, e encontraram efeitos positivos da intervenção precoce na ansiedade materna, nos sintomas depressivos e no coping materno. Com relação aos bebês, os efeitos foram positivos em relação ao tempo de internação e às taxas de amamentação.
Schiavo et al. (2020) encontraram diferenças significativas ao comparar o desenvolvimento de bebês pré-termo e a termo aos três meses de vida em todas as áreas avaliadas pela BSID-III, com maior atraso para os bebês nascidos pré-termo em comparação aos a termo. Embora o presente estudo não tenha realizado tal comparação, os achados indicam que mais da metade dos bebês pré-termo avaliados apresentaram desempenho abaixo da média em cognição, motor grosso e linguagem receptiva, o que reforça a importância de considerar as especificidades desse grupo.
Destaca-se que o presente estudo não teve um grupo controle, ou seja, mães e bebês nascidos a termo. Assim, ao considerar o desempenho dos bebês na BSID-III, foi comparado com a amostra normativa da escala americana. Esta questão pode ter impactado os resultados, visto a necessidade de considerar o impacto de variáveis culturais e contextuais no desenvolvimento (Cruz et al., 2022).
As mães variaram os seus comportamentos durante os cinco minutos de interação com seus filhos. De forma geral, passaram mais tempo brincando com seus bebês, observando-os e apresentando objetos. Atrair atenção, esperar e acariciar também foram comportamentos que tiveram uma duração maior. Esses dados confirmam os resultados obtidos por Rodrigues et al. (2022), à medida que as mães de bebês pré-termo que participaram dessa pesquisa emitiram com maior frequência comportamentos de acariciar e brincar com seus bebês. Uma possível hipótese para elas optarem por brincar com seus filhos sem introduzir objetos é que crianças pré-termo podem apresentar prejuízos na velocidade de processamento durante o primeiro ano de vida (Rose et al., 2002), o que pode levá-las a escolherem brincadeiras que possibilitam uma interação face a face e, por isso, têm maiores chances de resposta e envolvimento do bebê (Rodrigues et al., 2022). O comportamento de acariciar possivelmente está relacionado a tentativa de acalmar o bebê e ajudá-lo no processo de autorregulação.
Entre os comportamentos considerados negativos, ou seja, aqueles que poderiam prejudicar o desenvolvimento dos bebês, estimular em excesso e interromper as suas atividades foram aqueles com maior duração. Todavia, destaca-se que o tempo gasto pela mãe emitindo esses comportamentos foi pequeno (pouco mais de 20 segundos). Tais resultados diferem do estudo realizado por Granero-Molina et al. (2019), que indicou que mães de bebês pré-termo tendem a emitir com maior frequência comportamentos intrusivos e de superproteção.
Considera-se que variáveis contextuais, como escolaridade materna, nível socioeconômico, planejamento gestacional e apoio social, podem influenciar tanto o desenvolvimento infantil quanto os comportamentos maternos na interação com seus bebês (Hass et al., 2021, Schiavo et al., 2020). No presente estudo, observou-se que a maioria das mães possuía até o ensino médio completo e residia com o companheiro, aspectos que podem ter funcionado como fatores de proteção ou moderação da interação mãe-bebê, tornando mais provável a emissão de comportamentos maternos positivos. Recomenda-se que futuros estudos incluam análises que controlem e avaliem diretamente o impacto dessas variáveis.
Com relação ao rastreio de DPP, a média da pontuação obtida pelas mães foi abaixo do ponto de corte clínico do instrumento utilizado para avaliação, porém, ao considerar a classificação, 43,5% delas apresentaram indicadores clínicos de DPP. Este dado corrobora estudos que têm evidenciado que as mães de bebês pré-termo apresentam alta probabilidade de apresentar indicadores clínicos de DPP (Pisoni et al., 2019, Eduardo et al., 2019, Buesa et al., 2024).
No estudo de revisão de Santana et al. (2022), foram encontrados fatores de risco para a ocorrência da DPP, como a escolaridade materna, a multiparidade e a gestação não planejada. As mães do presente estudo apresentavam esses fatores de risco, o que pode ter impactado nesse resultado. Por outro lado, esse indicador não se correlacionou com o desenvolvimento dos bebês e com os comportamentos interativos maternos, indicando que as mães tinham outras reservas comportamentais ou que fatores de proteção poderiam estar presentes no seu ambiente e/ou no ambiente dos bebês. Outra hipótese para este resultado refere-se ao momento em que as mães responderam à EPDS, quando os bebês estavam com três meses de vida. A provável recenticidade dos sintomas maternos pode não ter influenciado, ainda, o desenvolvimento dos seus filhos. No estudo de Schiavo et al. (2021) também não foram encontradas relações entre os indicadores de saúde emocional materna (estresse, ansiedade e depressão) e o desenvolvimento de bebês pré-termo avaliado aos três meses de vida.
Brum et al. (2018) pontuam que o impacto negativo da DPP no desenvolvimento infantil vai depender de outras variáveis, como a idade da criança, a gravidade do transtorno materno e a qualidade do cuidado ofertado à criança. Além disso, outros fatores que estão relacionados a um agravamento da DPP e podem levar a um maior risco para o bebê são: o vínculo estabelecido entre o casal cuidador (Vanwalleghem et al.,2023), mães primíparas e diagnóstico de depressão anterior à gravidez (Giraldi et al., 2023). Destaca-se que a maioria das mães do presente estudo residiam com o parceiro, podendo este ser um fator de proteção. Ainda com relação às mães com indicadores clínicos, destaca-se que elas foram acolhidas por uma psicóloga e, quando necessário, encaminhadas para acompanhamento psicológico.
Em sua maioria, as correlações entre o desenvolvimento do bebê e os comportamentos maternos foram positivas e tiveram maior impacto para a linguagem do bebê. Brincar esteve positivamente correlacionado com a linguagem receptiva. Esperar, que é um comportamento que sinaliza responsividade materna, correlacionou-se com cognição, linguagem receptiva e desenvolvimento motor fino, assim como observado no estudo de revisão de Rocha et al. (2019). Este foi o comportamento com maior número de correlações, o que indica a sua importância para intervenções focadas na promoção da responsividade materna na primeira infância, em especial para o grupo de bebês nascidos pré-termo.
Brincar com o bebê sem utilizar objetos e esperar pelas suas respostas podem ser consideradas como respostas imediatas e contingentes das mães aos comportamentos das crianças de explorar e se comunicar. Ao brincar com o bebê, a mãe conversa, descreve e apresenta o mundo para ele. Ao aguardar pelas suas respostas, a mãe favorece a aprendizagem da troca de turnos, essenciais para a aquisição de outros repertórios do bebê (Donnelly & Kidd, 2021). Dado os resultados encontrados, ainda que correlacionais, pode-se considerar que, para esta amostra, os comportamentos maternos de brincar e esperar foram protetivos para o desenvolvimento destes bebês.
Quanto à linguagem expressiva, correlações negativas ocorreram com os comportamentos maternos de atrair a atenção do bebê para si e estimular em excesso, os quais podem se relacionar à intrusividade materna e se apresentar como fatores de risco para o desenvolvimento. Na medida em que a mãe estimula seu bebê em excesso e atrai a atenção para si, pode diminuir a sua sensibilidade em relação às necessidades do bebê e aos seus comportamentos exploratórios e de comunicação. Toscano et al. (2019), em uma metanálise, encontraram que os pais de crianças nascidas pré-termo, em comparação aos de nascidas a termo, apresentam maior probabilidade de se envolverem em práticas parentais controladoras. Este resultado destacaria a importância do acompanhamento destas famílias.
Considerações Finais
No presente estudo, a maioria dos bebês pré-termo apresentou desempenho dentro do esperado nas áreas de linguagem expressiva e desenvolvimento motor fino. O desempenho nas demais áreas avaliadas (cognição, linguagem receptiva e motor grosso) esteve abaixo da média, apresentando atraso. Todavia, este é um resultado esperado para bebês pré-termo que estavam sendo avaliados antes de qualquer intervenção. Tais dados apontam para a importância da avaliação precoce e do encaminhamento para serviços de intervenção o mais rápido possível.
As mães passaram mais tempo brincando com seus bebês, bem como observando, apresentando objetos para eles, atraindo sua atenção e esperando pela sua resposta. Indicadores clínicos de DPP foram identificados em 43,5% da amostra, todavia, estes indicadores não se correlacionaram ao desenvolvimento dos bebês e aos comportamentos interativos maternos. O comportamento materno de esperar foi aquele que mais esteve relacionado com o desenvolvimento dos bebês. Este comportamento e o brincar se apresentaram como fatores de proteção para o desenvolvimento da linguagem receptiva dos bebês. Por outro lado, atrair a atenção do bebê e estimular em excesso se apresentaram como fatores de risco para a linguagem expressiva. Tais dados mostram que o trabalho de intervenção precoce deve não somente ser focado na estimulação do bebê, mas também na interação entre a díade.
O estudo apresenta limitações, como o número reduzido de díades mães-bebês, a amostra de conveniência e a ausência de grupo controle composto por díades mães-bebês nascidos a termo, o que limita a generalização dos resultados. Além disso, o delineamento correlacional impede estabelecer relações causais entre os comportamentos maternos, os indicadores de DPP e o desenvolvimento dos bebês. Outra limitação se refere ao uso da BSID-III, que, embora amplamente utilizada, possui normas baseadas em uma amostra de bebês norte-americana, o que pode limitar sua sensibilidade ao contexto brasileiro. Destaca-se que os comportamentos dos bebês não foram incluídos nas análises, o que impede compreender de forma mais ampla e bidirecional as interações entre mães e filhos e seus efeitos sobre o desenvolvimento infantil.
Apesar das limitações apontadas, os resultados do estudo contribuem para a identificação de comportamentos maternos que podem ser protetivos e de risco para o desenvolvimento de bebês nascidos pré-termo e, assim, alvo de programas de intervenção precoce. Estudos futuros podem ampliar a amostra, incluir a análise dos comportamentos dos bebês e investigar a relação entre os comportamentos maternos, o desenvolvimento dos bebês e variáveis contextuais, como a escolaridade materna e o apoio social das mães para cuidado dos filhos e para sua saúde emocional.
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Recebido em: 10/06/2024
Última revisão: 27/05/2025
Aceite final: 27/05/2025
Sobre os autores:
Mariana Cristina Simioni: Graduanda em Psicologia pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). E-mail: mariana.simioni@unesp.br, Orcid: https://orcid.org/0000-0001-7233-9108
Tainá Guedes Silva: Graduanda em Psicologia pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). E-mail: taina.guedes@unesp.br, Orcid: https://orcid.org/0009-0004-8314-4583
Taís Chiodelli: [Autora para contato]. Doutora em Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Professora Assistente do Departamento de Psicologia da Faculdade de Ciências da UNESP, campus Bauru. E-mail: tais.chiodelli@unesp.br, Orcid: https://orcid.org/0000-0002-8586-1111
Olga Maria Piazentin Rolim Rodrigues: Livre-docente em Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Professora do Programa de Pós-graduação em Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem, da Faculdade de Ciências, da UNESP, campus de Bauru. Email: olga.rolim@unesp.br, Orcid: https://orcid.org/0000-0002-5332-256X
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